Desde
o primeiro sorriso
A
minha história de amor começou quando eu tinha apenas seis anos. Eu não
conhecia meu pai, e nem sabia que tinha um, pois minha mãe evitava falar dele,
sempre inventando desculpas rasas. Um certo dia ela acordou e disse “Vamos para
o Rio de Janeiro conhecer o seu pai”. Vi que ela preparou duas malas enormes
com coisas minhas e apenas uma pequena mala para ela. Eu nem imaginava o que
estava por vir adiante. Embarcamos e quando chegamos a uma casa maravilhosa,
que minha mãe dizia ser do meu pai, fomos recebidos por uma linda mulher
grávida. A princípio ela nos olhou assustada, mas nos convidou a entrar e
sentar. Meia hora depois chegou um homem que minha mãe simplesmente olhou pra
ele e disse “Filipe, esse é seu filho Lucas, vou fazer uma longa viagem e a
partir de agora ele é sua responsabilidade”. Naquele momento não sei quem ficou
mais assustado: eu, o estranho ou a mulher bonita. Minha mãe e o homem
conversaram e logo depois ela me deu um beijo e foi embora.
A
mulher bonita e o cara ficaram me olhando assustados, ela resmungava algumas
coisas para ele, e eu simplesmente chorava. Eu queria a minha mãe. Queria sair
da casa daqueles estranhos. Foi então que uma linda garotinha loirinha, de
expressivos olhos castanhos e um pouquinho menor que eu apareceu na sala. Ao
contrário dos outros dois, ela me olhou e sorriu. Foi o sorriso mais lindo que
eu recebi até então. Aquele sorriso ficaria marcado na minha memória para
sempre. Não demorou muito para que fossemos brincar e minha tristeza se
abrandar um pouco.
Quando
enfim minha guarda estava oficializada ao meu pai, percebi que ali seria minha
casa, que eu não ficaria mais com minha mãe. Mas não seria tão ruim, pois ali
eu teria uma família de verdade, inclusive eu já tinha um irmãozinho a caminho.
Minha adaptação inicial não foi fácil, eu chorava a todo instante querendo
minha mãe. A moça bonita que me atendeu quando cheguei era Caroline, a esposa
do meu pai, que depois de um tempo virou minha mãe, pois eu aprendi a amá-la
como se houvesse saído do ventre dela, e ela me amou como filho. E a linda
garotinha era Gabrielle, a filha da minha madrasta, e que futuramente seria a
grande paixão da minha vida, que me viraria do avesso. Todos os meus familiares
gostaram de mim, exceto meu primo Gabriel, que tinha a minha idade e se dizia
namoradinho de Gaby. Além de tudo ele era o afilhado queridinho de Carol. Nem
preciso dizer que não fui com a cara dele.
O
tempo foi passando, e à medida que crescíamos meus sentimentos por Gaby
floresciam. E o pior é que eu tinha que aguentar ouvir ela me chamar de irmão,
me tratar como um. Era que isso que éramos, uma família. Meu coração se negava
a aceitar que ela era minha irmã. Tive que calar meus sentimentos e seguir
adiante, sendo o irmão mais velho dela. O irmão superprotetor. Quando eu tinha
16 anos veio a primeira ferida no meu coração causada por ela: Gabrielle e
Gabriel começaram a namorar, com a permissão de nossos pais. Tinha que tolerar
aquele idiota dentro da minha casa o tempo todo, trocando beijos e carinhos com
a minha garota. O pior é que eu tinha que fingir estar feliz por minha “irmãzinha”.
Mais uma vez sufoquei meus sentimentos e segui adiante. Toda vez que eles
brigavam ela vinha chorar no meu colo, e eu tinha que consolá-la, conforme um
irmão faria. Quando sentávamos para ver um filme juntos eu morria de vontade de
acariciar seu rosto, beijá-la, dizer o quanto eu a achava linda, mas
simplesmente tinha que me controlar e comportar-me como um irmão.
Dois
anos se passaram e o namoro do meu “casalzinho preferido” ia ficando cada vez
mais sério, ela cada vez mais apaixonada. Tudo parecia conspirar contra mim,
até que um belo dia, na verdade um maravilhoso dia, Gabriel resolveu pedir um
tempo a ela, segundo ele estava se sentindo sufocado. Fiquei com muita pena
dela, a pobrezinha estava arrasada, mas no fundo eu estava radiante, aquela
poderia ser minha chance de conquistá-la.
Estávamos
a meses do vestibular, e costumávamos estudar juntos todas as tardes. Eu já
havia notado que estava rolando certo clima entre nós nos últimos dias. Ela me
olhava com mais atenção, parecia até ficar nervosa na minha presença. Em um dos
dias de estudo quase nos beijamos, mas ela recuou. Um dia, enquanto estudávamos
em meu quarto, decidi que era hora de abrir meu coração pra ela, que não podia
mais esconder meus sentimentos. Disse a ela que precisávamos conversar. Ela se
sentou na bancada de estudos e eu fiquei de pé em frente a ela. Peguei suas
mãos, olhei nos olhos dela e soltei a bomba “Gaby, sei que pode parecer
loucura, mas eu amo você. Amo desde a primeira vez que a vi, quando éramos
apenas duas crianças”. Ela ficou surpresa. Aproveitei o momento e a beijei. Foi
um beijo com tanta vontade, com tanta paixão, eu sentia que precisava
demonstrar naquele beijo tudo que eu sentia por ela. Era um beijo que estava entalado
há anos. No início ela ficou surpresa, mas acabou correspondendo o beijo na
mesma intensidade. Ela confessou que também sentia algo por mim, não sabia
definir ao certo o que era, mas não era simplesmente um carinho de irmãos.
Começamos a nos relacionar escondido dos nossos pais, não era um namoro, mas eu
sabia que futuramente viraria.
Infelizmente
não durou muito. Dias depois Gabriel se arrependeu de sua decisão e pediu a ela
para retomarem o namoro. Tola e apaixonada como era acabou aceitando. Foi a
segunda vez que meu coração foi dilacerado por ela. Dois meses depois, após ela
ter se entregado a ele, ele terminou em definitivo com ela. O estado dela era
lastimável, só chorava. Demorou para ela entender que realmente havia acabado,
e que precisava esquecê-lo e seguir em frente. Felizmente fomos aceitos em uma
universidade dos EUA, e isso encheu a vida dela de alegria novamente. Ela
mergulhou de cabeça nos preparativos da mudança, e evitava encontrá-lo.
Naturalmente
fomos nos aproximando, e quando estávamos prestes a ir para o EUA assumimos
nosso relacionamento para nossos pais. No início foi difícil para eles
aceitarem, mas ao ver nossa felicidade eles amoleceram. Mudamos-nos para solo
americano e fomos morar juntos. Pouco a pouco fui conquistando-a, e meses
depois ela estava perdidamente apaixonada por mim. Quanto mais o tempo passava,
melhor nosso relacionamento ficava. Eu fazia todas as vontades dela, a enchia
de amor e carinho. Tentava de todas as maneiras demonstrar o quanto a amava,
desde presentes a gestos e atitudes românticas. Ela era o centro do meu mundo.
Era incrível como combinávamos. Raramente brigávamos, e quando isso acontecia
só apimentava nossa relação. Nossos gostos eram tão parecidos. Ambos gostávamos
de viajar e tínhamos o desejo de conhecer o mundo todo. Nossas férias eram
divididas em um mês no Brasil com nossos pais e um mês viajando por algum lugar
do planeta. Por dois anos consegui evitar que em nossas idas para o Rio ela
encontrasse Gabriel. Mas o inevitável aconteceu. Sei que ele ficou encantado ao
vê-la, e tentou beijá-la, mas minha garota resistiu bravamente.
Os
anos seguintes foram ainda melhores. Cada dia eu tinha mais certeza de que ela
me amava. Planejávamos o futuro, depois da formatura nos casaríamos e
continuaríamos morando no EUA. Já até pensávamos nos nossos filhos. Às vezes
tudo parecia um sonho, um sonho que eu não queria acordar. À medida que minha
formatura ia se aproximando comecei a planejar nossos próximos passos. Eu sabia
que seu maior desejo era fazer uma volta ao mundo por um ano, por isso planejei
uma surpresa pra ela. Iríamos passar o natal e o ano novo com nossos pais no
Brasil, e logo depois partiríamos pelo mundo por 365 dias, exatamente como ela desejava.
Em algum lugar mágico e romântico eu a pediria em casamento, e quando voltássemos
para casa marcaríamos o casamento. Depois eu começaria minha especialização em
neurocirurgia e ela começaria a carreira dela na área de literatura inglesa. Seria
tudo perfeito!
Tudo
teria sido perfeito, se não tivéssemos ido para o Brasil. Ela estava muito
mudada, agora era uma mulher, uma mulher muito linda, confiante de si, que ganhava
olhares masculinos por onde passava. E claro que ela não passou despercebida
aos olhos de Gabriel, do ogro que a ferira anos antes. Ele também havia mudado,
agora era um homem, não digo que ele era bonito, mas pela expressão de Gaby
quando o viu pude perceber que ela achava que ele estava lindo. Quando um olhou
para o outro vi pela troca de olhares entre eles que aquele sentimento que
estava adormecido há anos estava acordando. Eu sei que ela tentou resistir,
tentou convencer a si mesma que era apenas uma recaída depois de tanto sem
vê-lo, mas não foi forte o suficiente para não sucumbir quando ele disse que a
amava e que lutaria por ela. Infelizmente meu sonho acabou.
Meu
mundo desabou quando ela me disse “Lucas, eu amo você, nós vivemos uma história
de amor incrível, você é muito especial, mas o grande amor da minha vida é ele”.
O meu sonho terminava ali. Foi difícil aceitar que ela estava trocando eu, que
a amava incondicionalmente, que a tratava como uma princesa, que estava
disposto a tudo para realizar seus sonhos, por um ogro que não era capaz de
abrir mão de seus objetivos para concretizar os dela, um idiota que a usara e
depois descartara como se fosse um objeto. Por um bom tempo achei que ela
recobraria a consciência e viria ao meu encontro, mas isso nunca aconteceu. Demorei
muito tempo, anos na verdade, para conseguir arrancá-la do meu coração e me
abrir novamente ao amor.
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