Em meus sonhos
Certos momentos servem
para nos levar de volta ao passado e nos faz recordar cada detalhe, cada
escolha. Hoje, especialmente, o passado vem me visitar e eu revivo com emoção
tudo que me fez chegar até aqui. E acabo de receber um bilhete que tem um
perfume que também me faz voltar ao começo de tudo. Um perfume de cravos, com
toque de madeira, folhas e canela. Um perfume que não me deixa esquecer Adrian.
Só que é impossível esquecê-lo. Tanto o seu perfume, como todo o resto já está
marcado em mim. Ah, meu o Adrian...
Eu era um pouco cética em relação ao
amor. Achava que era uma fantasia criada e que aquilo de fato não existia.
Parecia besteira demais essa história de “alma gêmea”, “amor a primeira vista”,
“o amor da minha vida”. De fato não consigo concordar muito bem com isso de “alma
gêmea”, de existir apenas uma pessoa pra mim em todo o mundo. Mas, hoje,
acredito em almas que se conectam, que estão em sintonia e juntas são únicas. E
quanto ao “amor a primeira vista” me abri a isso. Não sei se com Adrian foi
amor a primeira vista, mas voltando a tudo que vivemos desde que nos
conhecemos... Não sei... No final não importa. O que importa é que naquele dia nos
conhecemos...
Minha amiga Marília e eu tínhamos acabado
de nos mudar para a capital. Saímos para comemorar o primeiro dia de trabalho. Não
conhecíamos quase nada na cidade, muito menos aonde ir à noite para escutar
música boa e conhecer pessoas interessantes. Antes de sairmos, procuramos
rapidamente algum lugar não muito longe de onde morávamos. Achamos um bar com música
ao vivo. Parecia que sempre ficava movimentado e tinha os mais variados estilos
musicais. Concordamos e fomos até o bar. Tudo que lemos na internet estava
certo. Adoramos o lugar. Era a noite de MPB e eu amei. Mais tarde o lugar
ficava mais agitado e haveria DJ, tocando todos os tipos de música.
Arrumamos uma mesa próxima ao bar e
com uma ótima visão do palco, onde acontecia a apresentação da banda. Estava
mesmo muito cheio. Sempre fui um pouco tímida e dificilmente conseguia começar
uma conversa com estranhos. Marília não era muito diferente de mim. Aquela
seria mais uma noite de apenas duas amigas sozinhas. Seria. Fui até o bar
buscar algumas bebidas. Olhei para o lado e me deparei com um par de olhos
verdes me encarando. Os olhos verdes mais intensos e penetrantes que eu já
encontrei. Ele sorria de alguma piada que o amigo fazia, olhava ao redor para
as moças. E me lançou um sorriso encantador. Devo ter corado naquele instante,
mas consegui dar um sorriso tímido. Enquanto esperava as bebidas o observei.
Ele era lindo demais, uma visão, mas parecia um pouco alterado pela bebida. “Não
é pra mim”, pensei naquele instante. Eu nunca tive ideias sobre o cara ideal
(ainda mais porque não acreditava num grande amor), mas sabia, que mesmo sendo
lindo e encantador, não era o homem pra mim.
-
Nossa, Lila, vi um homem maravilhoso. – Ela deu uma gargalhada. – É sério. Mas
não é pra mim. E não sou pra ele.
-
Por que, Cat? – Ela ficou séria.
-
Olha pra mim. Não sou sexy, refinada... – Ela balançou a cabeça. – E parece ser
o tipo que curte aquelas mulheres mais volumosas... E sei lá. Não alguém como
eu.
-
Já te falei pra largar de ser preconceituosa. Não pode criar essas ideias antes
de conhecer as pessoas. E você é linda, inteligente se até sexy, quando quer. –
Eu sexy? Dei uma gargalhada tão alta que as pessoas ao lado me encararam. Essa
sim sou eu. Bonita sim, tímida e mestre em passar vergonha.
-
Só você mesmo. Eu sexy... – Balancei a cabeça contendo outra gargalhada. – E ele
estava bebendo demais, não gosto disso... – Um perfume de cravos (e canela,
folhas e madeira) chegou até mim. Um perfume inesquecível acompanhado daqueles
intensos olhos.
-
Não gosta do quê, senhorita? – Aqueles olhos verdes me encararam e devo ter
ficado super corada, de novo. – Podemos nos sentar com vocês? – Ele e o amigo continuavam
nos olhando intensamente.
-
Claro. – Consegui falar depois de um tempo. E eles se sentaram. Ele se sentou ao
meu lado e o seu amigo ao lado da Marília. Fiquei muito nervosa. E ele
continuava me encarando. – Sou a Catarina e ela a Marília. – Falei, porque
aquilo estava estranho. Ele sorriu pra mim. Quantos dentes! Que sorriso
maravilhoso.
-
É um prazer conhecê-las. Eu sou o Adrian e aquele meu amigo feio ali é o
Marcos. – O amigo dele fechou a cara, mas logo deu uma risada. – Ah, você disse
que não gostava de alguma coisa.
-
Ah... – Que vergonha! O que eu falo? - De passar vergonha. – Deu um sorriso
tímido.
-
Por causa daquela risada alta? – Assenti com a cabeça e ele sorriu. – Foi a
risada mais linda que já escutei. – Que vergonha! Eu não sabia responder. Acho
que ele estava flertando comigo, mas sou péssima nisso. – E ainda tímida? Acho
isso encantador. Você é encantadora e tão linda. – À medida que ele falava pude
sentir uma mistura daquele perfume, que eu tanto gostei, com álcool e cigarro.
-
Obrigada. E sou tímida mesmo.
Olhei para a minha amiga e ela
conversava com o Marcos. Parecia mesmo encantada, assim como eu. Mas, ao mesmo
tempo, eu sentia uma mistura de encanto com dúvidas. Nunca me relacionei desse
jeito com alguém como Adrian. Aos poucos pude entender melhor quem ele era.
Gostava de flertar, admirava muito uma mulher bonita, bebia bastante e era refinado
demais. Um “filhinho de papai”, falei mais tarde com a minha amiga. Foi essa a
minha primeira impressão. Marília e Marcos pareciam se entender. Eu estava me
entendendo com Adrian também, mas alguma coisa me falava que ele “não era mim”.
Tirando o fato de sermos de mundos completamente diferentes e de ele ter hábitos
que eu não gosto, aquela conversa era boa. Ele era muito inteligente e tinha
uma opinião diferente da que eu imaginava que ele teria. Eu tinha que parar com
esses preconceitos. Eu estava enganada. Muito enganada. Quanto mais ele falava,
mais eu me encantava. Ao final da noite, parecia que o conhecia há muito tempo.
Mas ainda sim, tinha alguma coisa que me falava pra ir com calma. Escutei minha
consciência e não aceitei a carona que ele e o amigo nos ofereceram. Mas
acabaram nos acompanhando até o táxi.
-
Foi um enorme prazer conhecê-la, Catarina. Preferia levá-la em casa, porque a
noite é muito perigosa. Mas entendo o seu anseio. Você é muito linda e inteligente.
Espero podermos conversar outras vezes. – E de novo aquele sorriso encantador.
-
Muito obrigada. E o prazer foi meu. Eu também espero vê-lo novamente. Você é
muito encantador... – E de novo, o sorriso tímido apareceu. Ele pegou minhas
mãos, deu um leve beijo e me deu um intenso beijo nos lábios. Fiquei trêmula,
mas correspondi. A minha cabeça girou e aquilo ocupou a minha cabeça durante
toda a volta para casa. Minha amiga também estava perdida em seus pensamentos,
com certeza pensando no Marcos.
Marília e eu conversamos um pouco
antes de dormir, falando sobre os homens que conhecemos. Ela se mostrou
empolgada e eu confessei que também estava bastante mexida. “Vocês trocaram os
números de telefone também, né?!” Confirmei e ela ficou satisfeita. Quando nos
separamos fiquei mais um tempo pensando... Ele se mostrou um pouco diferente do
que eu imaginava... Era um riquinho, que bebia e fumava demais, que
provavelmente já teve muitas mulheres, mas era muito mais... Num primeiro
momento ele era muito inteligente, compartilhava de muitos gostos que eu tinha,
e parecia trabalhador. Abri um sorriso. Mas eu não podia me iludir. Adormeci.
Mas aquela noite foi intensa... Sonhei com aqueles lindos olhos verdes, que me
encaravam tão profundamente, de uma forma que jamais me olharam. Estávamos num
jardim repleto de lindas flores. Não falamos nada. Ficamos um tempo nos
encarando, conversando apenas com os olhos. Então ele me pegou as minhas mãos e
as beijou. Tocou numa mexa solta do meu cabelo e deslizou os dedos até o meu
rosto. Aquele toque me fez arrepiar e sentir uma enorme emoção dentro do
coração. Era uma sensação nova e tão intensa. Ele tocou os meus lábios e se
aproximou de mim. Nossos olhos se encontraram, assim como nossos lábios...
Então acordei com o despertador tocando.
Adrian me mandou mensagem por cinco
dias seguidos. Queria me ver, mas tinha viajado a negócios. Eu não entendia
aquilo muito bem, mas à medida que conversávamos mais eu sentia vontade de
conversar com ele. Falávamos sobre tudo
e eu me sentia muito a vontade. No começo eu pensava que ele não iria querer me
ver, depois de recusar aquela carona. Mais uma vez criei ideias erradas. Ele era
muito mais do que imaginava. Tinha muitos defeitos e os que mais me incomodavam
eram a bebida e o cigarro. Mas não posso mudar as pessoas. Voltando de viagem
ele me telefonou e me convidou para jantar. Aceitei. Eu queria vê-lo, falar com
ele e quem sabe sentir de novo aquele beijo. Eu só pensava naquele beijo e no
sonho. Eu pensava nele e sorria sozinha. Muitas vezes Marília me cutucou porque
eu estava perdida em alguma coisa. Eu estava perdida naquele perfume, naqueles
olhos, naquele sorriso... Eu estava me apaixonando... Hoje posso falar, mas
naquele momento eu me recusava a aceitar. Tudo que eu não acreditava estava
preenchendo a minha vida.
Um dia, depois de me encontrar com
ele, minha amiga me pegou encostada na parede suspirando e sorrindo. Chamou-me
várias vezes, até aumentar a voz. “Eu amo Adrian. Eu o amo.” Eu disse e ela
sorriu. Chorei de emoção. Eu nunca tinha dito aquilo. Eu nunca amei um homem
antes. “Ele é o amor da minha vida”. Novamente um sorriso da minha amiga. “Já
falou isso pra ele?” Balancei a cabeça. E naquele momento eu percebi que
precisava falar. De que adianta amar se eu não puder assumir isso pra ele,
ainda mais depois dele falar que me amava. Sei que amor são mais atitudes do
que palavras, mas eu precisava falar. Ele precisava saber de mim. Desci
correndo as escadas do prédio onde morávamos. Ele não estava mais em frente ao
prédio. Peguei um táxi e fui até o apartamento dele. Encontrei com ele na recepção
do prédio. Sai correndo e cai no chão. Algumas pessoas me olhavam e ele se
virou. Veio correndo pra me ajudar. Antes que ele pudesse me levantar, agarrei
o seu rosto e lhe dei um beijo. “Eu te amo.” E finalmente eu disse. Não sei se
as pessoas escutaram, mas eu não me importei. Eu o amava. “Eu te amo e não me
importo de passar vergonha”, disse novamente. Ele sorriu e me levantou. “Eu
também te amo.”
Agora, três anos depois, ainda o amo.
Só que o amo mais. Um amor tão intenso como antes, mas mais maduro. Crescemos
juntos e conseguimos nos entender. Descobri que Adrian gostava mesmo de
conhecer muitas mulheres, mas depois que me conheceu tudo mudou. “A vida ganhou
um novo sentido. E se eu tenho você, não preciso de nenhuma outra.”, ele me
disse uma vez. Ele melhorou em relação à bebida também. Ele bebia muito por
causa da ansiedade, mas passou a ir ao médico e hoje está bem mais tranquilo.
Os cigarros... ah, ainda fuma. Posso conviver com isso. Pelo menos a quantidade
diminuiu. Ele vive falando que vai parar. Se ele realmente quiser, vou
ajudá-lo. Aos poucos ele vai conseguir. Ele é o homem mais forte que já
conheci. E lindo, sexy, charmoso, inteligente, carinhoso, fiel, leal,
maravilhoso... Às vezes me pergunto se mereço isso, se mereço ele. Daqui a alguns
minutos vamos nos casar... Estou me sentindo a mulher mais feliz do mundo por
ter o amor da minha vida ao meu lado. Entendemos-nos, confiamos um no outro,
nos amamos... Eu não acredito como eu era boba. O amor existe sim! Sinto novamente
o perfume do bilhete que ele me mandou e tenho que conter as lágrimas. Não
posso chorar agora. Tenho que ir me casar.
“Meu amor,
Você ainda tem tempo de fugir de
mim, mas espero que não faça isso. Eu te amo e quero que você seja a minha
esposa. Quero ser o seu marido e estar ao seu lado sempre. E acredite em mim,
sempre vou estar com você. Desde aquela noite, em que te conheci, sabia que
você seria alguém especial na minha vida. Não sabia que seria a pessoa mais
importante pra mim, mas eu deveria ter entendido isso de cara, quando tive um
sonho naquela noite... Não te contei isso. Mas eu sonhei com você. Sonhei com
os seus olhos, com o seu sorriso, com o seu toque, com o seu cheiro... Mais
tarde te conto os detalhes. Esqueça o que eu disse antes, não fuja. Te espero.
E te amo pra sempre!
O sempre seu,
Adrian.”
Que lindoooooo
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