Apenas uma garota
Quando eu tinha quinze anos, pensava que
iria aparecer a qualquer momento o meu “príncipe”, o grande amor da minha vida,
aquele capaz de fazer tudo para ter o meu amor. A verdade é que eu vivia a
maior parte do meu dia construindo o meu futuro amor. Na minha cabeça ele seria
de um tipo físico específico, me trataria como se eu fosse a única mulher no
mundo e me escutaria sempre. Eu tenho esse problema com “escuta”. Não vou saber
explicar muito bem, mas é que eu gosto de ser ouvida, de saber que sou
importante para as pessoas. E acho que quando me escutam, é porque se importam
com o que eu penso e digo, que se importam comigo. Eu ia construindo o modelo
ideal na cabeça e não conseguia me conformar com uma pessoa minimamente
diferente. O primeiro beijo? Foi
estranho, mas foi muito especial. Eu pensava que tinha encontrado o “príncipe”
e cedi às investidas de um boy malandro que eu conheci quando fui passar férias
na casa de uma prima. Mas valeu a pena. Aquele momento foi mágico, eu vivia um
conto de fadas. Dias depois o desespero. Meu príncipe também era o príncipe de
mais cinco meninas, tão ingênuas quanto eu.
Passei mais alguns anos com
dificuldades para me relacionar com os garotos. Eu não conseguia esquecer
aquele “perfil” criado na minha cabeça. Eu queria um príncipe, alguém mágico. Teve
um momento que eu achei que estava ficando louca. Talvez eu estivesse mesmo. Eram
crises e mais crises. Eu sabia que tinha que esquecer essa ideia maluca, que
devia conhecer alguém “real” e apenas viver a minha vida. Mas uma “outra eu”
vivia me pedindo pra continuar procurando, que meu príncipe estava em algum
lugar. Quando eu entrei para a faculdade decidi que não pensaria no futuro
amoroso, que iria focar nos meus estudos. Entro para a sala de aulas e quem eu
encontro? O boy malandro, vulgo dono do sorriso mais lindo, também conhecido
como David. Passei direto e me escondi no fundo da sala. Eu ia passar quatro
anos convivendo com ele? Sério mesmo? A maior decepção amorosa da minha pouco
experiente vida amorosa. O engraçado é que a relação mais intensa eu tive com
ele. Por isso não conseguia esquecer aquela decepção. Meu primeiro beijo, o
único boy que eu fiquei mais de três vezes, o quase príncipe. Ele realmente
tinha tudo para ser o tão procurado príncipe, mas estragou tudo sendo mais um
jovem malandro.
Eu fiquei mesmo mexida com a
presença do David na minha turma. Não prestei atenção na aula. Só ficava
imaginando porque ele não poderia ser o meu príncipe, por que ele tinha que ser
tão safado e querer várias ao mesmo tempo. “Para com isso, Bia. Príncipe não
existe. Foca nos estudos.”, eu dizia pra mim. Aos poucos fui deixando a loucura
de lado e percebi como o professor era lindo. Como eu pude perder isso? Era
lindo mesmo e falava tão bem... Pronto, mais um possível príncipe. Novamente
tirei aquela ideia da cabeça. Não podia romantizar tudo. A aula acabou e o
David foi conversar comigo. Ficou feliz em me ver, disse que eu desapareci, que
eu estava mais bonita, etc. Respondi secamente e ele foi embora. Mais tarde
descobri que não iria aturar ele em todas as aulas. Ele fazia um curso
diferente e aquela aula era apenas facultativa. Relaxei, sem precisar relaxar. Eu
sempre exagerei as situações, criando problemas sem ter. Enfim, naquele momento
me senti aliviada, porque nunca esqueci a decepção amorosa.
Apenas um semestre estando na mesma
sala com ele. Não criamos uma relação fora da sala. Nem na sala nos falávamos direito.
Nunca procurei saber dele. E nem ele de mim. Eu estava enxergando que a vida
era muito mais, que minha decepção era muito dramatizada, que eu era apenas uma
garota e não conhecia a vida. Ainda não conheço o suficiente. Como eu disse, as
minhas expectativas exageradas não me permitiram ter um relacionamento mais
profundo. A exceção foi um intercambista no meu segundo ano da faculdade. Eu já
não esperava mais um príncipe, eu já não tinha mais um modelo. Mas ele era
alguém muito próximo daquilo que eu achava importante em um homem. O melhor é
que ele nunca se cansava de me escutar. Eu poderia falar por várias horas
seguidas que ele nunca perderia o interesse. Claro que tinha muitos defeitos e
eu até gostava. Mas não deu certo. Um ano depois ele foi embora. Poderíamos
namorar a distância. Eu tinha mais um ano na faculdade e depois tentava ir até
ele. Mas não fizemos esforço nenhum para que aquela relação continuasse.
Naquele momento eu não sabia explicar por que não tínhamos força e vontade para
fazer isso. Hoje eu sei que não havia amor de verdade. Era paixão e muita
amizade. Mas faltava o amor pra dar combustível, pra fazer arder as nossas
vontades, para fazermos tudo um pelo outro. É uma parte da minha vida que eu
gosto, e muito. Até hoje converso com o meu querido amigo Fernando, o espanhol
mais lindo que eu já vi. Ah, ele está noivo. E isso me enche de felicidade.
Mas é isso, aos poucos me abri.
Comecei a enxergar que eu gostava de outros “perfis” de homens, que eles me
interessavam também. Mas eu era muito travada. Eu não conseguia continuar as
relações. Tudo simplesmente morria. Eu pensava que eu não era o suficiente para
aqueles homens que eu encontrava. Minha autoestima estava péssima. Não
enxergava a beleza em mim, de nenhuma forma. Eu cobrava uma atitude da parte
deles, mas não fazia a minha parte. Eu tinha medo de um relacionamento mais
profundo, de deixar as minhas fraquezas escancaradas e me decepcionar. De ser
mais uma pessoa na vida daquele homem e depois que ele me conhecesse de
verdade, o interesse acabasse. Eu tinha medo de ser eu. Eu tinha medo de não
gostarem de quem sou eu.
E assim foram se passando os anos.
Eu sabia do meu valor, mas não o achava suficiente para outra pessoa admirar.
Porque eu também conhecia os meus defeitos e achava que ele iria repelir
qualquer pessoa. Depois de muito fugir dos relacionamentos, fugir dos homens e
de mim mesma, eu me vi perdida no tempo. Até que um dia minha amiga me deu um “tapa”
e disse como eu estava com o pensamento confuso. Que a vida tem muitas possibilidades...
“Meu anjo, minha menina, eu te amo tanto, muito mesmo. Mas preciso ser sincera.
Eu odeio quando você tenta controlar toda a arrumação da nossa casa, quando
você dá uma de mãe e me controla. Mas eu aprendi a conviver com você. Porque eu
te amo. Amo o cuidado que você tem comigo. Amo os vários chás que você faz, amo
ser acordada pela sua linda voz cantando de manhã. Eu te amo e aceito seus
defeitos. Quem foi embora ou um dia ainda vai, é porque não te ama.” A Silvia
falou e isso acabou comigo. Chorei por algumas horas, mas finalmente entendi.
Quem realmente me amava estava sempre ali comigo. Não me julgava, nem fugia
quando eu fazia uma coisa errada. Depois
desse conselho, consegui seguir em frente e dar uma chance para um boy que eu
tinha conhecido. Finalmente o primeiro namorado (aos 24 anos). Meses depois
tudo acabou. Ele me traiu, tentou se explicar, mas eu não aceitei. E não me
arrependo. Semana passada eu descobri que ele traiu a ex-noiva, um mês antes do
casamento. Ah, e não me arrependo de ter tido o primeiro namorado tão “tarde”.
Eu tive minhas inseguranças, meus medos, mas nunca me deixei levar pela pressão
externa. Ninguém tem o direito de impor o meu tempo. Ele é meu.
Lembro disso tudo porque ontem uma
coisa muito especial aconteceu. A imaturidade nos cega, não nos deixa seguir o
caminho (certo ou errado). Eu não tentava viver. Na adolescência o fascínio por
um príncipe. No inicio da idade adulta eu estava travada, não queria ninguém. Depois
os medos bobos, as inseguranças. Felizmente eu tenho a Silvia na minha vida.
Estou crescendo. Ainda sou uma garota de 28 anos, a espera de quebrar mais ideais
pouco saudáveis. Ainda tenho muitos sonhos. E estou vivendo um. “Minha garota
está aí. Não quero que você fuja de mim de novo.” A voz vem atrás de mim. É o
David. Aquele mesmo, o boy malandro. Nada como uma conversa. Ontem a noite ele
me pediu em casamento, depois de dois anos de namoro. E claro que eu aceitei.
Não é todo dia que um príncipe malandro quer algo comigo. Não é todo dia que um
boy muito charmoso, abre o sorriso mais lindo do mundo só pra me escutar falar
por horas e horas. Não é em qualquer lugar que eu encontro alguém que eu amo e
que me ama.
Nenhum comentário:
Postar um comentário