quinta-feira, 23 de março de 2017

O amor que me transformou

Hoje é mais um daqueles dias que me sento à beira do Tâmisa para lembrar-me de Will. Na verdade, penso nele o tempo todo, do amanhecer ao pôr do sol, da hora que acordo a hora que durmo. Como esquecer alguém que me fez tão feliz?! Alguém que me ensinou a ser uma pessoa melhor, que me fez compreender que sou a única responsável por minha própria felicidade. Alguém que abriu os meus olhos e me ensinou que minhas condições financeiras não me faz melhor do que ninguém.
Ainda me lembro de cada momento que passamos juntos, bons e ruins. Quando nos conhecemos eu tinha 18 anos e Will 21. Eu era uma patricinha mimada, arrogante e imatura, estava me recuperando de uma decepção amorosa que havia sofrido há um ano. Eu me achava superior em relação a outras pessoas simplesmente porque era rica, acreditava que o dinheiro me tornava melhor que os outros. Eu não sabia o que era humildade, embora meus pais sempre tenham tentado me ensinar.
Ao contrário de mim, Will era extremamente maduro, humilde e solidário, vivia em busca da justiça para os mais necessitados, e foi por essa razão que ele escolhera cursar direito. Sempre que ele me via maltratando alguém, parava para me confrontar e esfregava umas verdades na minha cara. Encontrar alguém que me confrontasse foi quebrando minha armadura, foi abrindo meus olhos para o mundo, e pouco a pouco nos tornamos amigos. No início foi difícil, pois eu era cabeça dura e relutava em enxergar que Will estava sempre coberto de razão. Mas com a persistência e a paciência dele, acabei mudando. Foi uma mudança gradativa, mas muito significativa. O ponto crucial foi quando, com a ajuda dele, me livrei das amarras do passado, quando enfim entendi que Otávio não havia me traído, que ele nunca havia me amado, que quem criou aquela ilusão foi eu.
Não sei dizer em que momento nossa relação mudou, pois nossa amizade virou amor. Começamos a namorar, e num piscar de olhos estava perdidamente apaixonada. Ao ser dominada por esse sentimento, percebi que o que eu havia sentido por Otávio não era amor, era apenas uma paixão de adolescente. Amor era o que eu sentia por Will, era não, é, pois apesar das circunstâncias ainda o amo incondicionalmente. Esse amor me transformou, esse sentimento me fazia querer ser uma pessoa melhor, ser alguém que meus pais e Will teriam orgulho, uma pessoa que se preocupa com o próximo. E com a ajuda do meu príncipe, eu consegui. A Laura que sou hoje, aos 23 anos, não se parece em nada com a Laura de cinco anos atrás.
Nosso relacionamento estava cada dia melhor, evoluindo muito rápido, e depois de um ano de namoro decidimos morar juntos. Nessa época eu havia mudado muito, ainda havia alguns aspectos em que eu precisava evoluir, mas já era uma pessoa bem melhor, já havia amadurecido. Nossa convivência era tranqüila, regada a muito amor, paixão e companheirismo, coisas típicas de um casal jovem apaixonado. Estávamos sempre juntos. Will era o “namorido” perfeito, sempre atencioso, carinho e apaixonado. Com suas atitudes me fazia sentir a garota mais especial e sortuda do mundo. Dificilmente meu amor chegava em casa, do estágio, sem me trazer uma florzinha ou um chocolate.
Tem dias que acordo e acho que, ao abrir a porta do quarto, sentirei o cheiro inebriante da panqueca que ele me preparava todas as manhãs, recheada de chocolate e morangos. Mas então a realidade vem à tona e me lembro que isso nunca mais acontecerá, que nunca mais sentirei o sabor da sua panqueca, seu abraço apertado e super protetor, o calor dos seus beijos, ou simplesmente receber aquele olhar que diz “eu te amo” sem pronunciar uma única palavra. Então as lembranças do dia em que meu mundo desabou me vêm à mente. Era uma linda manhã de maio, primavera em Londres. Eu estava indo para a faculdade e ele para o escritório de advocacia que havia começado a trabalhar. Decidimos ir a pé para sentir o perfume das flores que enfeitavam as ruas de Londres, aproveitar aquela linda manhã. Num momento de distração atravessei a rua sem olhar para os lados, e num momento que pareceu durar uma eternidade, meu herói se jogou na frente de um carro que vinha em alta velocidade, em minha direção, salvando minha vida e tirando a sua. Foi ali que minha vida desmoronou. Foi no hospital, horas depois, que ele me deixou.
O início da minha vida sem ele foi muito difícil, eu parecia um corpo que só vegetava. Não tinha vontade de comer, de sair de casa, e nem mesmo de tomar banho. Até dormir era uma tortura, pois nos meus sonhos ele estava ali comigo. E na verdade estava, pois Will se tornou meu anjo protetor, meu guardião. Com muito apoio, principalmente da minha sogra, consegui me reerguer e seguir em frente. Não digo que foi fácil, ainda é difícil. Tem dias que olho para a entrada de nosso apartamento e fico esperando ele atravessar a porta, com uma flor na mão, me dar um beijo e sussurrar em meus ouvidos: “Minha Laura, como senti sua falta hoje”. Se eu soubesse que o destino seria tão traiçoeiro com nós dois, jamais teria enrolado para marcar o casamento. Hoje talvez eu teria um filho dele, um fruto do nosso amor.
O que me conforta hoje são as lembranças lindas do amor que vivemos. Um amor verdadeiro que muitas pessoas não terão a oportunidade de viver. Vivemos em três anos o que muitos casais que passam uma vida inteira juntos não vivem. Sei que um dia terei de reconstruir minha vida, encontrar um alguém que me faça sentir pelo menos metade do amor que eu sentia por ele, e construir uma família, pois esse foi seu ultimo pedido. Ele era tão maravilhoso, tão perfeito, tão nobre, que suas últimas palavras foram sobre meu futuro, sobre minha felicidade: “Laura, meu amor, não estarei mais aqui para te amar, e por isso quero que você reconstrua sua vida. Quero que você encontre um novo amor, construa uma família e seja feliz. E nem pense em dizer não, é meu último desejo. Te amo, e onde eu estiver te amarei para todo o sempre, cuidarei sempre de você, minha doce Laurinha.”
Sei que um dia terei que cumprir a promessa que fiz a ele de ser feliz, de encontrar alguém, mas mesmo que eu ame outro alguém, parte do meu coração será sempre dele. Essa promessa faz parte de um futuro ainda muito distante, porque meu coração dilacerado pela dor ainda pertence completamente a William, o grande amor da minha vida.

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