O amor que me transformou
Hoje
é mais um daqueles dias que me sento à beira do Tâmisa para lembrar-me de Will.
Na verdade, penso nele o tempo todo, do amanhecer ao pôr do sol, da hora que
acordo a hora que durmo. Como esquecer alguém que me fez tão feliz?! Alguém que
me ensinou a ser uma pessoa melhor, que me fez compreender que sou a única responsável
por minha própria felicidade. Alguém que abriu os meus olhos e me ensinou que
minhas condições financeiras não me faz melhor do que ninguém.
Ainda
me lembro de cada momento que passamos juntos, bons e ruins. Quando nos
conhecemos eu tinha 18 anos e Will 21. Eu era uma patricinha mimada, arrogante
e imatura, estava me recuperando de uma decepção amorosa que havia sofrido há
um ano. Eu me achava superior em relação a outras pessoas simplesmente porque
era rica, acreditava que o dinheiro me tornava melhor que os outros. Eu não
sabia o que era humildade, embora meus pais sempre tenham tentado me ensinar.
Ao
contrário de mim, Will era extremamente maduro, humilde e solidário, vivia em
busca da justiça para os mais necessitados, e foi por essa razão que ele
escolhera cursar direito. Sempre que ele me via maltratando alguém, parava para
me confrontar e esfregava umas verdades na minha cara. Encontrar alguém que me confrontasse
foi quebrando minha armadura, foi abrindo meus olhos para o mundo, e pouco a
pouco nos tornamos amigos. No início foi difícil, pois eu era cabeça dura e
relutava em enxergar que Will estava sempre coberto de razão. Mas com a
persistência e a paciência dele, acabei mudando. Foi uma mudança gradativa, mas
muito significativa. O ponto crucial foi quando, com a ajuda dele, me livrei
das amarras do passado, quando enfim entendi que Otávio não havia me traído,
que ele nunca havia me amado, que quem criou aquela ilusão foi eu.
Não
sei dizer em que momento nossa relação mudou, pois nossa amizade virou amor.
Começamos a namorar, e num piscar de olhos estava perdidamente apaixonada. Ao
ser dominada por esse sentimento, percebi que o que eu havia sentido por Otávio
não era amor, era apenas uma paixão de adolescente. Amor era o que eu sentia
por Will, era não, é, pois apesar das circunstâncias ainda o amo
incondicionalmente. Esse amor me transformou, esse sentimento me fazia querer
ser uma pessoa melhor, ser alguém que meus pais e Will teriam orgulho, uma
pessoa que se preocupa com o próximo. E com a ajuda do meu príncipe, eu
consegui. A Laura que sou hoje, aos 23 anos, não se parece em nada com a Laura
de cinco anos atrás.
Nosso
relacionamento estava cada dia melhor, evoluindo muito rápido, e depois de um
ano de namoro decidimos morar juntos. Nessa época eu havia mudado muito, ainda
havia alguns aspectos em que eu precisava evoluir, mas já era uma pessoa bem
melhor, já havia amadurecido. Nossa convivência era tranqüila, regada a muito
amor, paixão e companheirismo, coisas típicas de um casal jovem apaixonado.
Estávamos sempre juntos. Will era o “namorido” perfeito, sempre atencioso,
carinho e apaixonado. Com suas atitudes me fazia sentir a garota mais especial
e sortuda do mundo. Dificilmente meu amor chegava em casa, do estágio, sem me
trazer uma florzinha ou um chocolate.
Tem
dias que acordo e acho que, ao abrir a porta do quarto, sentirei o cheiro
inebriante da panqueca que ele me preparava todas as manhãs, recheada de
chocolate e morangos. Mas então a realidade vem à tona e me lembro que isso
nunca mais acontecerá, que nunca mais sentirei o sabor da sua panqueca, seu
abraço apertado e super protetor, o calor dos seus beijos, ou simplesmente
receber aquele olhar que diz “eu te amo” sem pronunciar uma única palavra.
Então as lembranças do dia em que meu mundo desabou me vêm à mente. Era uma
linda manhã de maio, primavera em Londres. Eu estava indo para a faculdade e
ele para o escritório de advocacia que havia começado a trabalhar. Decidimos ir
a pé para sentir o perfume das flores que enfeitavam as ruas de Londres,
aproveitar aquela linda manhã. Num momento de distração atravessei a rua sem
olhar para os lados, e num momento que pareceu durar uma eternidade, meu herói
se jogou na frente de um carro que vinha em alta velocidade, em minha direção,
salvando minha vida e tirando a sua. Foi ali que minha vida desmoronou. Foi no
hospital, horas depois, que ele me deixou.
O
início da minha vida sem ele foi muito difícil, eu parecia um corpo que só
vegetava. Não tinha vontade de comer, de sair de casa, e nem mesmo de tomar
banho. Até dormir era uma tortura, pois nos meus sonhos ele estava ali comigo.
E na verdade estava, pois Will se tornou meu anjo protetor, meu guardião. Com
muito apoio, principalmente da minha sogra, consegui me reerguer e seguir em
frente. Não digo que foi fácil, ainda é difícil. Tem dias que olho para a
entrada de nosso apartamento e fico esperando ele atravessar a porta, com uma
flor na mão, me dar um beijo e sussurrar em meus ouvidos: “Minha Laura, como
senti sua falta hoje”. Se eu soubesse que o destino seria tão traiçoeiro com
nós dois, jamais teria enrolado para marcar o casamento. Hoje talvez eu teria
um filho dele, um fruto do nosso amor.
O
que me conforta hoje são as lembranças lindas do amor que vivemos. Um amor
verdadeiro que muitas pessoas não terão a oportunidade de viver. Vivemos em
três anos o que muitos casais que passam uma vida inteira juntos não vivem. Sei
que um dia terei de reconstruir minha vida, encontrar um alguém que me faça
sentir pelo menos metade do amor que eu sentia por ele, e construir uma
família, pois esse foi seu ultimo pedido. Ele era tão maravilhoso, tão
perfeito, tão nobre, que suas últimas palavras foram sobre meu futuro, sobre
minha felicidade: “Laura, meu amor, não estarei mais aqui para te amar, e por
isso quero que você reconstrua sua vida. Quero que você encontre um novo amor,
construa uma família e seja feliz. E nem pense em dizer não, é meu último
desejo. Te amo, e onde eu estiver te amarei para todo o sempre, cuidarei sempre
de você, minha doce Laurinha.”
Sei
que um dia terei que cumprir a promessa que fiz a ele de ser feliz, de
encontrar alguém, mas mesmo que eu ame outro alguém, parte do meu coração será
sempre dele. Essa promessa faz parte de um futuro ainda muito distante, porque
meu coração dilacerado pela dor ainda pertence completamente a William, o
grande amor da minha vida.
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