domingo, 19 de março de 2017

Destinos cruzados

O sonho de todo recém-formado é criar estabilidade já no seu primeiro emprego. Mas nem sempre é assim. E comigo não foi diferente. Para conseguir me estabilizar como médica, e realizar um projeto que tinha em mente antes mesmo de começar a faculdade, tive que enfrentar os preconceitos e estereótipos impostos pela sociedade. Tive que provar para uma comunidade inteira que eu não era apenas mais uma patricinha da Zona Sul que acha que o mundo gira ao redor do seu próprio umbigo. Que eu era sim uma garota de Ipanema, mas que tinha como principal objetivo de vida ajudar os mais necessitados.
Aos 10 anos decidi que gostaria de estudar medicina, e como sempre fui apaixonada pelo Canadá, comecei a me preparar para futuramente ser aceita na Universidade de Toronto. Quando iniciei meu curso e percebi a profundidade da profissão, vi que não bastava apenas salvar vidas em um hospital na zona sul de uma grande capital, eu queria ser diferente, eu queria fazer a diferença, e foi assim que decidi levar atendimento a pessoas que tem dificuldade de acesso a um centro de saúde. Foi assim que resolvi, com o apoio de outros profissionais da área, construir um Centro de Atendimento Médico em uma das comunidades do Rio de Janeiro. E foi nessa comunidade que encarei os maiores desafios da minha vida, tanto na profissional quanto na amorosa. No início foi difícil provar aos moradores da minha capacidade e das minhas intenções, e entre essas pessoas que desconfiavam de minhas intenções estava Arthur.
Quando nos conhecemos foi implicância a primeira vista. Não havia um dia em que nos encontrávamos e não trocávamos farpas. Arthur era líder comunitário e por isso se achava o dono do lugar, que podia decidir quem entrava e saía, sendo assim não aceitava que uma garota rica transitasse por seu morro sem sua autorização, não aceitava que alguém com as minhas condições financeiras fosse perder seu tempo com um lugar que era invisível para os outros moradores da cidade. E eu não aceitava que ele tentasse me impedir ou me fazer desistir de estar lá todos os dias, de colocar em prática meus objetivos. Pouco a pouco fomos percebendo que aquela implicância não era raiva, era atração, mais que isso, era paixão. E assim nos rendemos ao inevitável.
Sabe aquilo que é errado para todos, mas é o certo para você?! É exatamente isso que Arthur representa na minha vida. Um relacionamento que muitos acreditavam que jamais daria certo, simplesmente porque sou a “patricinha de Ipanema” e ele o “favelado”, mais um preconceito imposto pela sociedade, principalmente por meu pai. Nosso relacionamento nunca foi perfeito, nem preciso citar as inúmeras diferenças que existem entre nós, a começar pelas condições financeiras. Meu pai jamais aceitou que eu tenha trocado meu noivo rico por um rapaz da favela. Jamais aceitou que sua Duda tenha crescido e feito suas próprias escolhas. Mas não me importa que ele seja pobre e tenha crescido em uma comunidade carente. Porque o que realmente faz sentido é quem Arthur é por dentro.
Apesar das diferenças, eu e Arthur nos completamos. São diferenças que se tornam aprendizado. Com Arthur aprendi a ser melhor, e o ajudei a ser melhor. Aprendemos juntos a importância de não julgar as pessoas antes de conhecê-las melhor, de não julgar pela aparência. Se não tivéssemos baixado a guarda, eu ainda seria para ele a patricinha intrometida, e na minha visão ele seria o rapaz arrogante e orgulhoso que não aceita estranhos em sua comunidade. Mas hoje conheço bem seu coração e sua alma, e sei que por trás de sua fachada de durão se esconde um rapaz amoroso e solidário.
Não sei o que o futuro nos reserva, não sei se passaremos a vida inteira juntos. Mas o que espero de verdade é que daqui a alguns anos estejamos casados e felizes, que possamos olhar para nossos filhos e dizer que o amor de Arthur e Eduarda venceu as barreiras do preconceito e superou todos os obstáculos, e que força nenhuma do mundo pode ser maior que a do amor.



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