Desencontros
Esta não é uma história em que os
personagens tem a certeza que era o destino eles se encontrarem e reencontrarem.
Não mesmo. Alicia conheceu Renan por meio da sua prima, que mudou de bairro e,
consequentemente, acabou mudando de escola. Dois anos mais novo, Renan estava bem
longe do radar da amável e tímida Alicia. Ele não chamou sua atenção quando o
conheceu. Na verdade, ela ainda estava encantada pelo antigo vizinho da prima.
No entanto, com a mudança, e sem motivos justificáveis para visitar o outro
bairro, ela decidiu que era hora de deixar esse amor para trás. O fato é que
ela estava mais apaixonada do que ele, que nunca fazia nada para se aproximar e
conhecê-la melhor. “Bom, pelo menos aqui você vai conhecer outras pessoas, pode
se apaixonar novamente, Lili”, Tatiana disse à prima. “Você é muito
engraçadinha, Tati. E eu não quero me apaixonar de novo. Dá muito trabalho”,
Alicia respondeu. “Besteira! Aquele cara não merece sua atenção. Você é demais
pra ele. Você é linda, inteligente, meiga, um partidão. Quem sabe um dos meus
colegas de escola te interesse”, brincou. A jovem desiludida balançou a cabeça
e não levou a sério a afirmação. Ela costumava gostar da sua figura refletida
no espelho, mas inúmeras vezes duvidou se era bonita o suficiente para chamar a
atenção do idiota. “Eles são mais novos!”, ela falou de repente e acrescentou: “Mas
não importa, Tati. Não estou procurando uma nova paixão. Eu quero é esquecer aquele
cara e focar nos estudos. E você deveria fazer o mesmo”.
No
entanto, Tatiana tinha outros planos. Ela já tinha algumas ideias em mente. Depois
de muito insistir, ela conseguiu arrastar a prima para a festa de boas-vindas
da sua nova escola. A jovem passou a maior parte do tempo no canto, se esquivando
de qualquer pessoa, e sempre muito próxima dos seus tios, o que não dava
abertura para os garotos se aproximarem. Mas Tati já sabia bem o que fazer. Ela
pediu que a prima a acompanhasse ao banheiro e assim deu início ao seu plano.
Elas seguiam numa direção bem diferente daquela que realmente deveriam ir. Ao
perceber que não estavam na entrada do banheiro, Alicia fechou a cara e olhou
daquele jeito incisivo para a prima. “Não me olhe assim. Eu só quero conversar
com uma pessoa e preciso que você me apoie. Ah, e caso você goste de algum dos
amigos dele, pode conversar também. Não seja tão tímida. Aproveite o momento”,
disse e deu uma risadinha. Tatiana saiu andando na frente e entrou na sala de
aula para encontrar o rapaz que a esperava.
Alicia
se viu numa situação bastante desconfortável. Ela queria sair correndo dali,
mas não podia. Tinha que acobertar a prima e aparecer perto dos seus tios sem
ela não seria fácil de explicar. Além disso, três amigos do rapaz que a Tatiana
estava conversando estavam quase do seu lado, apenas esperando uma abertura
dela. Naquele momento, a jovem percebeu que seus rostos não eram desconhecidos.
Ela se lembra de vê-los no salão principal a observando, sendo que um deles a encarava
ainda mais, com um sorriso bem encantador e malicioso. Alicia respirou fundo e
conteve uma risada nervosa. No entanto, o seu semblante suavizou, o que deu a
abertura que os rapazes precisavam. Um deles se apresentou, falava rápido e
super empolgado. O segundo também se apresentou e começou a fazer elogios a aparência
dela. Já o terceiro, que ela descobriu se chamar Renan, apenas disse o seu nome
e continuou a encarando daquele jeito que é impossível desviar. Suas pernas
tremiam mais que o de costume e ela sentia as bochechas queimarem. Alicia sabia
que eles estavam esperando qualquer deixa dela pra saber qual deles poderia
conversar particularmente com ela. A ideia a deixou ainda mais nervosa. Não sabia
o que fazer. Nem sabia se queria aquilo. Enquanto isso, Renan não desviava o olhar.
Aquela atitude deixou a jovem curiosa. Ela estava doida pra saber o que ele
pensava, se pensava nela ou algo do tipo. “Vamos conversar sozinhos, Renan?”, ela
disse inesperadamente, deixando os outros dois incrédulos, até porque eles
faziam de tudo para prender a atenção dela com palavras exageradas.
“Você
demorou demais”, Renan disse e Alicia arregalou os olhos. O rapaz acrescentou: “É
isso mesmo. Desde que te vi entrar naquele salão, eu sabia que estaríamos aqui
juntos”. A jovem deu uma gargalhada encantadora, deixando o rapaz a sua frente
totalmente mexido. “Você só pode estar brincando. Agora só falta falar em
destino”, falou. Renan se aproximou, completamente envolvido pela presença da
jovem à sua frente, e sussurrou em seus ouvidos: “Destino é besteira. Não
existe isso. Existe apenas as nossas ações e as consequências delas. E neste
momento, tem apenas uma consequência que me interessa”. Por mais que houvesse
muito o que Alicia queria retrucar, não conseguiu, pois a forma que ele disse
aquilo a fez estremecer. Era inegável a química entre eles. Era inegável que
eles possuíam uma conexão física impressionante. E assim aconteceu o primeiro
beijo, com calor, emoção, empolgação, urgência e muita vontade de ambos.
A
Tatiana, que acabou vendo aquele primeiro encontro, ficou impressionada,
surpresa com a forma que eles se olhavam, conversavam e brincavam. E ela ficou
ainda mais surpresa quando sua prima telefonou na semana seguinte, falando que
gostaria de sair com ele. E a assim a Tati combinou, já que a ajudava também. Os
quatro saíram juntos e o novo encontro foi tão empolgante quanto o primeiro,
repleto de entusiasmo, conversas engraçadinhas e beijos urgentes e gostosos. No
entanto, o que aconteceu depois foi pra deixar todas as partes perdidas de dúvidas.
Eles mantiveram contato nas redes sociais, mas os dias foram passando e
passando e eles se distanciaram. Nenhum dos dois sabe explicar o que aconteceu
ou o que faltou. Estava claro, para a maioria, que ele era muito afim dela e
ela era uma incógnita. Na verdade, ela não sabia. Parte dela ainda doía pela
paixão anterior, mas a outra parte gostava de conversar com o Renan. O fato é
que ninguém se esforçou para continuar, seja lá o que fosse aquilo.
Oito
ano depois, eles ainda não haviam se reencontrado. Eles se viam através das
postagens das redes sociais. Sempre curtiam as coisas um do outro, mas nada
demais. Sem comentários, sem pistas sobre o que sentiam. Neste tempo, Alicia
conheceu algumas pessoas especiais, mas não namorou. Já Renan teve dois
relacionamentos, sendo um breve e um bem longo. A jovem não se incomodou ao ver
nada. Ela sentia apenas um carinho por ele. Já o rapaz, agora, aparentemente,
mais maduro, era uma incógnita quanto a ela. Parecia que para ambos, aquele
breve envolvimento ficou completamente no passado. No entanto, bastou se verem
brevemente, distante, numa pizzaria, para aquela energia que sentiram naquele
primeiro encontro, tomasse conta dos seus pensamentos. Um dia depois Renan
enviou uma mensagem, dizendo à Alicia que ela estava ainda mais linda. E a
partir daquele momento, eles iniciaram um caloroso bate-papo, com aquela mesma
empolgação de antes. E com o passar do tempo, as conversas se tornaram mais
frequentes e mais adultas. Havia ainda aquelas piadinhas que os empolgava há oito
anos, mas agora também haviam conteúdos mais picantes. Não deu outra, eles
combinaram de verem, mesmo em meio aos seus dias super ocupados.
O reencontro não parecia reencontro. Não parecia que o tempo tinha passado, mesmo com as claras mudanças em duas vidas. Eles mantiveram a essencial e a forma leve e empolgada de enxergar o outro. No entanto, Alicia estava mais aberta e achava que já tinha passado da hora de focar em alguém. Não era namorar. Se rolasse, tudo bem. Mas na cabeça dela não existia a palavra namoro. Ela apenas sabia que tinha um carinho pelo Renan e sentia que valia a pena descobrir onde eles poderiam chegar. Não havia pressão da parte dela, nem grandes expectativas. A jovem, agora uma mulher feita e mais madura, mas com aquele mesmo encanto da adolescência, esperava que ele a enxergasse de forma parecida, que não a encarasse como qualquer outra. Ela queria que fosse especial, mesmo sem rotulo. E as conversas, o reencontro, tudo a estimulava, a fazia se sentir especial e pronta para se abrir ainda mais. No entanto, ele ficou estranho. Mesmo com a correria do dia a dia, eles sempre davam a atenção para o outro, mas nos últimos dias ele estava diferente. A dúvida começou a tomar conta daquela mente agitada. Por fim, Alicia não aguentou mais e fez a temida pergunta: “Por que você está estranho? Aconteceu alguma coisa?” Renan não sabia se explicar, as palavras sumiram de sua boca. “Só não estou pronto para me envolver tanto novamente”, disse. Aquela frase bastou para Alicia acreditar que estava no momento errado na vida de alguém que tinha muito carinho. Para evitar o sofrimento, ela se afastou.
Mesmo aceitando que aquilo era o melhor para os dois, Alicia vivia se questionando. Ela questionava suas atitudes e escolhas, as palavras escolhidas. Ela questionava tudo até o dia em que conheceu outra pessoa e gradativamente seus pensamentos mudaram de foco. Para evitar qualquer confusão ou frustação, a jovem decidiu ir devagar. E assim aconteceu. Aos poucos se abria para esse novo alguém especial, recíproco e atencioso. No entanto, uma vez ou outra via uma postagem do Renan que despertava um pensamento confuso. Com o tempo, esses pensamentos diminuíram a frequência, até o dia que ela se abriu ainda mais para a nova paixão. Parecia que tudo estava caminhando bem e a palavra “namoro” retornou a sua mente com tranquilidade. Ela sentia que era questão de mais um ou dois encontros para ele a pedir em namoro.
“Estou
com saudades. Você me faz muita falta. Sinto falta dos seus beijos, do seu
cheiro delicioso, de tocar a sua pele delicada... Nossa! Não sei mais o que
posso dizer. Há tanto que preciso dizer. Mas, primeiro, me desculpe por te afastar
da minha vida. Diga que não é tarde. Quero te ver todos os dias da minha vida,
Lili. Permita que eu faça parte da sua vida. Volte pra mim”, Renan enviou. A
mensagem chega alguns minutos antes da Aliciar para um novo encontro, provavelmente,
um encontro decisivo. Além disso, a mensagem chega com três meses de atraso. Um
tempo que cai, literalmente, sob os ombros da jovem. Ela se joga no sofá e
chora. Não sabe o que dizer. Após ler aquela mensagem, um arrepio forte atravessou
o seu corpo e um friozinho cutucou o seu coração. “O que eu faço? Por que agora?
Por que, Renan? Parecia tudo tão certo. Por que, meu coração? Por que me deixar
assim? Era para ser simples Por que?”, se questionou aos soluços. Ninguém a
respondeu, pelo menos, não de imediato.
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