segunda-feira, 5 de junho de 2017

Uma paixão em alto mar

Sonhar sempre foi uma das minhas grandes capacidades, e quando me tornei amiga de Catarina essa capacidade aumentou, pois a partir daquele momento começamos a partilhar nossos sonhos e a sonhar juntas. Nós iniciamos grandes mudanças há três meses, quando nos mudamos para o Rio de Janeiro, e uma de nossas metas, além de realizar nossos sonhos, é nos arriscarmos em novas aventuras, experimentar coisas novas. Coisas que quando morávamos no interior não estavam ao nosso alcance.
Quando começamos a decidir qual seria nossa nova aventura, Helena, minha amiga de infância e agora companheira de apartamento, sugeriu uma viagem num cruzeiro. Em um primeiro momento estremeci só de imaginar. Sempre achei que um cruzeiro deve ser fantástico, mas nunca cogitei a possibilidade de estar em um, por causa do medo de um naufrágio. Não sei porque, mas desde novinha tenho certa fobia a água em grandes proporções, como rios, lagoas, barragens e alto mar. Na praia só costumo ficar em locais onde a água chegue no máximo até minha cintura. Diante da insistência e empolgação das minhas amigas acabei aceitando o desafio. Algo dentro de mim, talvez minha intuição, dizia que aquela viagem seria especial, que algo muito bom iria acontecer.
Ao pisar no navio minha primeira reação foi pânico, um desejo de sair correndo de lá. Mas resisti, sabia que precisava confrontar meus medos. Fiquei tão impressionada com a embarcação, era ainda mais luxuosa do que eu imaginava. Nossa suíte era maravilhosa, escolhemos uma bem grande, para que pudéssemos ficar as três juntas. A varanda tinha uma vista incrível. Não vou negar que olhar aquela imensidão de mar me deixou alarmada, mas ignorei minha mente para curtir a viagem.
Em nossa primeira noite resolvemos jantar no principal restaurante do navio. Entre tantos pratos deliciosos optamos por um da culinária francesa. Durante todo o jantar senti que estava sendo observada, mas não sabia por quem. Ao final da refeição o chef de cozinha veio nos cumprimentar, disse que precisava conhecer quem havia pedido seu prato predileto de preparar. Quando eu disse que havia sido eu que pedira o Pavé de saumon grillé ele me exibiu um sorriso encantador, um sorriso cheio de promessas. Depois do jantar resolvemos tomar um drink em um dos bares, e quando já estávamos nos retirando para a suíte senti alguém se aproximar, e quando me virei dei de cara com Guilherme, o chef do restaurante que havíamos jantado.
Catarina e Helena foram dormir e eu sentei para tomar mais um drink, desta vez na companhia do cozinheiro mais lindo que eu já conhecera. Depois de um tempo de conversa percebi que ele não apenas cozinhava bem, mas também era um excelente galanteador. Marcamos de nos encontrar na noite seguinte, depois do expediente dele. No horário combinado nos encontramos, dessa vez resolvemos tomar um vinho para combinar com a noite fria. Mais uma vez fiz outra descoberta a cerca de Guilherme, além de entender tudo da cozinha européia, o belo homem que estava sentado a minha frente era um enófilo de carteirinha. Resolvemos dar uma volta pelo convés para ver a noite, e foi ali que ele me beijou pela primeira vez.
Almoçamos juntos no dia seguinte, e a noite nos encontramos novamente. Dessa vez quando ele me beijou senti algo diferente. Havia pouco tempo que eu havia terminado um relacionamento, e por isso achei que não estava preparada para me envolver emocionalmente com alguém de novo. Mas Eu me sentia tão bem na companhia de Gui, ele era tão espontâneo, não tentava me impressionar o tempo todo como muitos homens faziam. Ele se abria, mostrava quem realmente era, mas nada forçado, eu podia perceber que aquele era ele de verdade. E eu gostava de quem ele era. Minhas amigas disseram que estava me apaixonando por ele, mas eu disse que não, que só estava curtindo o momento. No fundo do meu coração eu sabia que era verdade, mas me negava a aceitar. Um relacionamento entre nós era improvável, já que ele trabalhava viajando o tempo todo.
Eu tentava me manter firme, mas era impossível resistir a aquele homem bonito, inteligente e engraçado. Cada vez que ele abria a boca me arrancava um sorriso. Definitivamente eu me sentia uma adolescente apaixonada no auge dos meus 24 anos. Diante daquele charme irresistível e de tantas investidas decidi deixar de pensar no futuro e viver o momento, resolvi me entregar a aquela paixão que estava me consumindo por dentro.
Os dias seguintes transcorreram de forma maravilhosa. Passávamos a manhã e a tarde juntos, a noite nos encontrávamos depois do expediente, e não nos desgrudávamos mais até o horário dele trabalhar novamente. À medida que a viagem ia chegando ao fim meu coração se apertava, pois eu não sabia o que seria de nós quando chegasse ao Rio, ou melhor, não sabia se existiria um nós. Eu não queria mais desgrudar dele, mas sabia que esse momento chegaria.
Quando chegamos ao Pier Mauá, no Rio de Janeiro, não tivemos coragem de nos despedirmos de verdade, apenas trocamos um longo beijo e um abraçado apertado, e cada um seguiu seu rumo. Nada de promessas e planos que não dariam certo. Apenas guardaríamos um ao outro em nossos corações como a melhor lembrança daquela mágica viagem. Trocamos nossos telefones, portanto, se tivermos que ficar juntos o destino se encarregará de nos unir novamente.

domingo, 28 de maio de 2017

Minha parceira

            Eu não acreditava em destino, mas depois de alguns anos de amizade com a Ana, comecei a acreditar que existem sim pessoas predestinadas a se encontrarem e coisas traçadas pra nossas vidas. Mas claro que o destino não funciona sozinho. Nossas escolhas e atitudes moldam o que de fato vai acontecer. Todo o dia penso em como sou sortuda por ter feito a “escolha” que me colocou na vida da Ana, a minha melhor amiga. Somos muito mais que apenas grandes amigas, somos irmãs por escolha, parceiras na vida.
            Antes de conseguir o grande emprego da minha vida, eu tinha que arrumar um emprego para ter experiência. Mesmo sem muita animação, eu me candidatei a uma vaga numa empresa que eu sabia que não era muito boa. Mas assim é a vida... Fui contratada. Quem eu encontro lá, também recém contratada? Ana, claro. O mais estranho é que já nos conhecíamos há alguns anos, mas nunca tínhamos parado pra conversar. O trabalho nos aproximou. E ela também esperava estar em um trabalho diferente. Naquele momento achávamos uma coincidência. Mesmo tendo a mesma profissão, ainda pensávamos em apenas uma coincidência. Não era... Então o trabalho ficou melhor. Tudo com a minha amiga é muito melhor.
            Mas não posso falar que a amizade começou com um dia. De fato, no mesmo dia em que nos encontramos já começamos a conversar bastante. Aos poucos nos reconhecemos, criamos laços, descobrimos muita coisa em comum (muita coisa mesmo! É de assustar ou agradecer.). Um tempo depois, que eu nem sei dizer quanto, nós éramos as melhores amigas. Fazíamos muitas coisas juntas (coisas que não demandavam sair muito de casa, porque somos muito caseiras.), conversávamos sobre qualquer coisa. Sempre tivemos essa liberdade, de poder falar as maiores loucuras uma com a outra sem receber criticas.
            Estar com a Ana é me encontrar. Digo isso porque além de sermos muito parecidas, a liberdade que uma tem com a outra permite que eu seja o tempo todo eu mesma. Por mais que eu me mostre para outras pessoas, seja sempre sincera sobre quem sou eu, ás vezes é difícil de me soltar, de deixar transparecer principalmente os meus defeitos. E às vezes eu acho que a minha parceira me conhece melhor que eu mesma. Ela conhece as minhas “caras” de satisfação, insatisfação, nojo, tristeza, raiva... Ela simplesmente me conhece, me entende e respeita as minhas “fases/faces”. A maioria das pessoas não costuma ter muita paciência. Felizmente eu tenho a Ana em minha vida. Posso começar o dia muito feliz e terminá-lo super estressada. Isso não acontece sempre, mas costuma acontecer. E ela, como sempre, entende essa minha rotineira mudança de humor. Sei que é irritante e já melhorei bastante, muito mesmo. Tudo isso graças aos “puxões de orelha” da minha corajosa amiga.
- Você está fazendo aquela cara de nojo, Agatha. Para com isso! As pessoas não vão entender. – Ana me cutuca e eu dou uma risada.
- Eu queria poder ver essa “cara”. Deve ser engraçado. Mas não sei controlar. E a culpa é desses caras falando coisas idiotas. – Digo baixinho para a minha amiga.
            Esse dia foi horrível, engraçado, uma confusão. Ana e eu, mais uma vez tínhamos outra coisa em comum. Dificuldade pra arrumar encontros decentes. Por sairmos pouco, não nos socializávamos com muitos homens e quando isso acontecia a nossa timidez atrapalhava. Mas às vezes marcávamos alguns encontros, e a maioria das vezes era encontro duplo. Como esse aí, que os nossos pretendentes eram bem idiotas. Eu estava segurando o meu descontentamento e o sono. Ficamos algumas horas escutando eles falarem sobre como eram interessantes. E eles estavam muito longe de serem interessantes. Aquele dia parecia perdido. Mas no final foi interessante. Conseguimos sumir de perto dos “pretendentes”. Felizmente o bar estava cheio. E quando chegamos a uma distância boa deles, pude relaxar e rir bastante. Essas coisas sempre aconteciam com nós. Depois de alguns minutos, dois homens nos abordaram. Estávamos cansadas e não esperávamos mais nada daquele dia. Eu já não escondia o meu cansaço e a Ana não brigou comigo por não estar com a “cara boa”, porque a dela também não estava.
- Sei que você já está cansada, por isso quero só o número do seu celular. – Dei um sorriso, porque não esperava por aquilo e estranhamente senti uma coisa forte no meu peito ao conversar com aquele homem. – Ah, e meu amigo também quer o número da sua amiga.
            Não estendemos muito a conversa. Os quatro estavam cansados. Mas aqueles minutos foram os melhores minutos de toda a noite. Dias depois, um novo encontro duplo. Encontros duplos nos deixavam mais a vontade e relaxadas. Depois do primeiro encontros, houve um segundo, um terceiro, um quarto... Vários encontros. Júlio e Hugo, esses são os nomes dos homens das nossas vidas. O amor surgiu para as duas ao mesmo tempo. Seria mais uma coincidência? Começamos a duvidar. Mas, na verdade, não importa muito definir. Viver é o que importa e saber o valor da nossa amizade. Dois anos depois daquele encontro duplo (que finalmente deu certo) eu estava me casando com o Júlio, o amor da minha vida. Um mês e meio depois do meu casamento, Ana se casou com o Hugo.
            Eu amo a minha Ana, a minha amiga, a minha irmã e parceira. Sei que cada escolha que fizemos, muitas vezes horríveis (como aquele encontro com aqueles homens idiotas), ajudou para que hoje estivéssemos mais fortes do que nunca. Cada minuto vivido juntas, cada atitude boa e ruim, contribuiu para o que hoje chamamos de “destino”. É maravilhoso ter alguém em quem confiamos, que nos entende, nos respeita e apóia. E melhor ainda quando todos os sentimentos são recíprocos. Amamos-nos demais e cada dia é uma nova prova da nossa grande amizade. Quem dera se todos encontrassem a sua parceira. O mundo seria melhor. Porque o amor nos deixa melhores. Ao lado da Ana encontrei meu outro amor, o Júlio. E ao meu lado a Ana encontrou o seu outro amor, o Hugo. E há um ano, mais uma vez juntas, conhecemos os nossos novos amores.
- Minha afilhada, Maria, está maravilhada. É muito parecida com a mãe mesmo. Adora algodão doce. – Ana me tira dos meus pensamentos. Sorrio com a felicidade atravessada em meu coração.
- E o meu afilhado, David, está cada dia mais parecido com a mãe, louco pela piscina de bolinhas. Não adianta negar, sabemos que você está doida pra brincar junto. – Abraço a minha amiga. – Vamos lá! Eu também quero brincar com eles. O aniversário dos dois está lindo. 


sexta-feira, 26 de maio de 2017

A mudança

São 9:00 horas da manhã, estou deitada na minha cama ao lado do meu amor, que dorme profundamente. Ainda estou extasiada pela noite de ontem. Thiago, meu namorado, me pediu em casamento num lindo jantar a luz de velas, no meu restaurante preferido. Olhando para esse homem lindo, que tanto amo, me sinto totalmente culpada por quase tê-lo deixado escapar. Ficava ouvindo as más línguas e quase não dei uma chance a esse homem maravilhoso.
            Conheci Thiago há três anos, quando comecei a trabalhar em uma empresa de tecnologia, no setor de comunicação. Eu havia acabado de me formar e consegui uma vaga de assistente de comunicação, não era o que eu queria, mas como recém formada não podia exigir muita coisa. Nos meus primeiros dias na empresa nossos caminhos não se cruzaram, pois ele estava viajando a trabalho. Em uma manhã de quarta-feira, três semanas depois do meu início, encontrei um homem que eu ainda não conhecia no meu setor. A primeira vista o achei bonito, mas nada muito exagerado. Perguntei a Camila, minha nova amiga, quem era aquele homem, e ela então apresentou Thiago, o Gerente de Contratos da empresa. Pouco depois fiquei sabendo que ele era o “galinha” de lá, corria atrás de todas as mulheres e todas se jogavam a seus pés. Já de cara pensei: “Não fui com a cara dele, e ele nem é essa coisa toda, é apenas bonito”. Comecei a perceber que ele se achava demais.
            Conversava com meu colega apenas o essencial, parecia que rolava uma antipatia entre nós, nem eu ia com a cara dele e nem ele ia com a minha. Ele simplesmente não perdia a oportunidade de me cutucar, com alguma provocação. Passados uns dois meses começamos a nos tratar melhor. Não provocávamos um ao outro e conseguíamos trocar algumas palavras sem uma má resposta do meio. Comecei a perceber que ele estava me olhando diferente, sorria pra mim a todo o momento, e não era qualquer sorriso, era um flerte. Eu não tinha interesse nele, mas gostava de flertar com ele, me fazia sentir desejada. Não demorou muito para que ele me convidasse para sair. Metade de mim queria ir, mas tinha uma vozinha na minha cabeça que dizia “Não caia na lábia dele, ele é um sem vergonha, lembra?!”. Superei aquela metade que queria dizer sim e disse “não”. Ele ficou chateado e isso me deixou meio vulnerável, mas segui firme na minha resposta. Por alguns dias ele me tratou com indiferença, mas logo voltou a me tratar normalmente, até passamos a conversar mais. Quanto mais criávamos intimidade, mas eu me sentia atraída por ele. Comecei a ver detalhes nele que antes eu não via, como o furinho que ele tinha no queixo. Contei isso a Helen, minha amiga de infância. Ela dizia que eu deveria dar uma chance a ele, me disse que as pessoas mudam, e que se ele realmente era do jeito que diziam, o amor poderia mudá-lo.
            Parecia que quanto mais eu lutava em dizer não, mais o destino queria me fazer dizer sim. Como na tarde que caiu uma tempestade justamente no fim do expediente. Fiquei na porta do prédio imaginando como eu iria embora, já que eu havia deixado a sombrinha em casa e o ponto de ônibus era longe. Para minha surpresa Thiago me ofereceu carona, fiquei receosa em aceitar, mas como não tinha outra opção acabei aceitando. Conversamos tanto durante o trajeto. Ele falou um pouco dele e dos comentários a cerca dele, disse que não era bem assim do jeito que as pessoas falavam, que era sim um paquerador, mas simplesmente porque ainda não encontrara a pessoa ideal para mudar sua vida. Quando cheguei em casa fiquei decepcionada por ter que deixá-lo ir, mas era o melhor a fazer.
Persistente como era Thiago não desistiu de mim e novamente me convidou para sair. Eu estava tão atraída por ele que dessa vez não consegui dizer não, mesmo sabendo que poderia sair dessa história com o coração partido. No dia combinado fiquei super ansiosa, as horas pareciam passar bem lentamente. Quando ele chegou para me buscar estava estonteamente lindo, tão cheiroso, aquele perfume nunca mais saiu da minha mente. Saímos para comer uma pizza e tomar um vinho. Entre tantos assuntos descobrimos muitas coisas em comum, como o desejo de fazer um mochilão pela América. A conversa estava tão boa que não percebemos o tempo passar. Em momento nenhum ele tentou me beijar, simplesmente estava deixando a noite rolar. Aquilo me fez pensar que realmente ele não era aquilo que as pessoas falavam. No final da noite, quando me deixou em casa, finalmente me beijou. Ah aquele beijo! Fiquei pensando nele a noite toda.
 No outro dia no trabalho tentei agir normalmente, mas a presença dele me deixava ansiosa e nervosa. Queria muito experimentar aqueles lábios novamente. Para minha completa felicidade ele me chamou para sair novamente, e depois mais algumas vezes. Quando percebi já estava totalmente apaixonada, morrendo de medo de o seu lado safado falar mais alto e eu me machucar. Mas aconteceu exatamente o contrário. Ele também se apaixonou e me pediu em namoro. No início fiquei com medo, insegura, mas à medida que o tempo foi passando a confiança foi crescendo. Thiago saia comigo na rua e simplesmente só olhava para mim, para ele não existia outras mulheres. Fui percebendo que as palavras de Helen faziam total sentido, ele havia mudado completamente, agora era um homem fiel e que se desdobrava em maneiras de demonstrar o amor que sentia por mim.
Quanto mais o tempo passava, mais nos amávamos, e então começamos a planejar o futuro. Além de tudo eu havia sido promovida, agora era Analista de Comunicação, o que possibilitava fazer novos planos. Começamos a falar em casamento e filhos, e decidimos que nossa lua de mel seria o mochilão pela América, pois depois que tivéssemos filhos esse desejo seria difícil de realizar. Eu só não imaginava que o pedido estava tão próximo. 
Olho para o lindo anel no meu dedo anelar esquerdo e começo a sorrir, não acredito que daqui a alguns meses estarei casada com esse homem lindo que está abraçado a mim. Serei eternamente grata a ele por ser tão persistente, pois se não fosse assim não estaríamos aqui juntinhos agora. 

sábado, 20 de maio de 2017

Inimigos

- “Meu amor, você promete não deixar-me ir embora?”
- “Nunca.”
            Inúmeras vezes eu disse pra mim mesma que a vida é muito incerta e nada é pra sempre. Mesmo assim eu me esqueci de ser realista e fiquei apegada ao amor. Um amor doado e pouco correspondido. Para uma relação dar certo e continuar forte por muitos e muitos anos, deve haver reciprocidade. Uma pessoa sozinha não faz uma relação. Agora eu sei, depois de dois anos do dia em que eu fui embora da vida do meu Marcelo. Eu deveria saber assim que fiz aquela pergunta. Eu estava extremamente apaixonada e como medo de perder o meu amor. Ele não disse “eu prometo”, ele disse “nunca”. Mas a palavra “nunca” é muito forte pra ser usada. Na verdade, palavras não asseguram nada.
            Conheci o meu ex-namorado no casamento da minha prima, Paula. Nós nunca fomos muito próximas, por isso eu não conhecia o circulo de amizades dela. O Marcelo e ela trabalham juntos há muito tempo. Paula sabia que eu estava solteira e atacou de cupido. Até que não foi um trabalho difícil. Marcelo sempre foi muito agradável, bonito e inteligente. Gostei dele na hora e ele sempre dizia que se apaixonou por mim assim que me viu. Não duvido disso, pode mesmo ser verdade. Paixão não é a mesma coisa que amor. Quanto ao amor, não consigo acreditar que ele tenha me amado como eu o amei. De jeito nenhum.
            Marcelo e eu ficamos juntos três anos. Nem sei como eu consegui ficar esse tempo todo com ele. Sei sim. Como eu disse, ele é muito agradável. Esse tempo todo longe dele me ajudou a enxergar melhor o que foi o nosso relacionamento. Dois anos para entender que eu estava sozinha naquilo. Dois anos pra entender que eu não tinha amor. Dois anos para “curar” o meu coração. Hoje estou bem. Mas foram momentos muito difíceis. Várias vezes eu quis voltar, ligar, correr pra ele. Todos os dias foi uma luta. Eu consegui. Demorou, mas eu consegui. Não sei quanto a ele. Tenho um pouco de curiosidade, porque sou assim muito curiosa. Mas não passa de curiosidade. Sei que ele está solteiro e bem, porque a Paula me falou.
            Os primeiros meses de namoro eu estava encantada, apaixonada e começava a amá-lo. Ele era carinhoso e muito dedicado. Sempre trabalhou muito e eu entendia. O trabalho nunca foi um problema, hoje eu sei. Quando nós namorávamos, eu achava que o trabalho dele era nosso inimigo. Eu estava muito enganada. Ele tinha (deve ter ainda) um horário bem pesado. A responsabilidade dele na empresa era bem grande, porque ele é um dos gerentes. Mas não é o principal. O outro gerente, não lembro o nome, não ia a todas as viagens, porque não era necessário. Eles deviam revezar no trabalho. Mas o Marcelo estava obcecado, ia a todas as reuniões e em todas as viagens. Eu dizia pra ele relaxar, mas ele não concordava. Ele estava preocupado porque a empresa onde trabalha queria cortar gastos e ele queria manter o trabalho dele. Eu acabei entendendo. Até aí tudo bem. Um dia saímos junto a Paula e o marido dela. E ela acabou contando que estavam contratando mais pessoas na empresa e ainda estavam estudando uma cidade pra abrir uma filial. Num primeiro momento eu não entendi. O Marcelo falou que iriam demitir e a Paula disse que iriam contratar. Fiquei confusa, tinha alguma coisa errada.
- A situação da empresa está mesmo boa, Paula? – Eu a perguntei, quando ficamos sozinhas.
- Sim, Rebeca. Estamos muito felizes lá. Deve ter até alguma promoção. Acho que o Marcelo vai se dar bem, porque ele é muito amigo da chefa.
- Sério? Que bom. – Dei um sorriso pra esconder o quanto eu estava desconfiada. – Eu ainda não a conheci.
- Eles saem muito juntos pra jantar. Geralmente o outro gerente vai às reuniões em outras cidades e o Marcelo fica com a chefa resolvendo as coisas por aqui. Estranho vocês não se conhecerem ainda. – Depois que acabou de falar, ela percebeu a minha cara e entendeu tudo.
- Sim. – Balancei a cabeça.
- Desculpa, Rebeca. Eu não queria deixar você assim... – Ela também acabou ficando desconfiada.
- Tudo bem. Isso é bem estranho mesmo.
- Pode não ser nada. – Ela segurou a minha mão.
- E pode ser tudo...
            Mais tarde naquele dia, eu não aguentei. No inicio, o Marcelo tentou mudar o assunto. Eu não aceitei e ele confessou que saiu algumas vezes com ela. “Não é traição.”, ele disse. “Claro que é. Você ficou com outra mulher.” Finalmente ele assentiu e disse que foram apenas três vezes e era por causa do trabalho. Eu sabia que ele queria melhorar a posição dele no trabalho, mas não sabia que ele usaria uma pessoa pra isso. Fiquei chocada mais com o motivo do que com a traição em si. “Não vai repetir. Eu só quero você.” Sai da casa dele e fiquei uns dias pensando. Eu estava mesmo apaixonada. Ele não me procurou e eu pensei que não tinha feito isso porque eu pedi. Mas hoje sei que ele não se importava tanto. Eu não aguentei e perdoei a traição. Depois disso, ele tirou férias junto comigo e fomos viajar. Ficamos bem nesse mês sozinhos. Acho que ele não me traiu mais. Acho.
            Quanto mais eu estava eu o amava, menos ele se importava.
- Eu te amo. – Eu disse pela primeira vez pra ele.
- Eu também te amo. – Ele também disse pela primeira vez.
- Não precisa dizer só porque eu te disse. – Eu não queria forçar nada. Só disse que o amava porque eu realmente o amava.
- Não é isso. Gosto de estar com você e te amo. Afinal, são apenas palavras...
            Antes que eu pudesse refletir melhor, ele me beijou e tirou muita atenção daquelas palavras. Um tempo depois fiquei pensando naquelas palavras e fiquei sem entender. Agora que a minha mente está mais clara, eu entendo. Ele estava certo. São apenas palavras. Eu gostava de escutá-las sim. Escutar que alguém te ama faz bem. Mas faz mais bem ainda ver as atitudes que provam esse amor. Depois da traição fiquei incomodada com o trabalho dele, afinal ele ficou com a chefa. Mas para mostrar que estava comigo, o Marcelo me apresentou pra ela. Tentei ficar mais tranquila. Eu o amava e não pude deixar de apoiar ele, pois eu sabia do valor daquele trabalho na vida dele. O problema é que ele não tinha essa mesma consideração comigo. Nunca perguntava do meu trabalho, se eu gostava, nada. Ele só escutava sobre o meu trabalho quando eu falava pra ele. Mesmo assim, sei que ele não gostava de falar disso. Aí eu mudava de assunto, por exemplo, falando sobre coisas da vida dele. Então ficávamos bem. Tudo mudou quando ele finalmente aceitou sair comigo e alguns amigos do meu trabalho. Ele conheceu o meu amigo Léo e cismou com ele. Disse que nós éramos muito próximos... Isso é verdade. Léo e eu somos amigos há muitos anos, mas nunca passou disso.
- Esse cara está apaixonado por você.
- Não está não. Somos amigos, eu já te disse. – Eu realmente já tinha contado sobre a minha amizade com o Léo, mas ele não prestou atenção. Ele não prestava atenção em nada.
- Claro que está. Olha como ele te olha. Você não pode trabalhar com alguém assim... O que as pessoas vão pensar de mim? Não posso parecer corno. – Tive que fingir que não ouvi. Dei uma risada e mudei de assunto.
            Cheguei a pensar que o Marcelo estava brincando, mas ele falou sério. Não dei ideia pra não piorar a situação. Muitas outras vezes ele tentou evitar que eu saísse com o Léo e meus amigos do trabalho. Confesso que eu fiquei um tempo afastada dos meus amigos. “Eles são inimigos da nossa relação.”, Marcelo falava. E os meus amigos falavam que ele me controlava demais. Hoje eu sei que meus amigos nunca foram os inimigos. Tenho vergonha de lembrar o tanto de coisa que me privei por causa dele. E ele nunca se importou. Ele era possessivo. Eu era meio que um objeto pra ele. Alguém pra ele exibir e não para amar.
            Além da possessividade, falta de interesse por minhas coisas, o Marcelo também não gostava de ir à casa dos meus pais comigo. Ele falava que se sente pressionado na casa dele. Meus pais são como todos os pais, só querem o meu bem. Eu pensei que eles tinham assustado o Marcelo, falando de casamento ou coisa assim. Mas um dia conversei com a minha mãe e ela disse que nunca falou de casamento ou futuro com ele. Até porque eles me conhecem bem e sabem que eu prefiro conduzir as coisas sozinha. Meus pais confiam em mim. Eles não deviam ter confiado. Passei muito tempo enganada, amando sozinha, vivendo um namoro sozinha.
- Podíamos ir a praia nesse feriado, é tão perto. E eu quero ficar sozinha com você. – Eu sugeri.
- Não dá. Vou te levar naquela festa da empresa. As pessoas precisam ver que eu sou estável. Vai fazer bem pra mim.
- Podemos ir à praia no dia seguinte.
- Não dá, Rebeca. Quero ficar disponível, para o caso de precisarem de mim.
- Mas é feriado e te dispensaram.
- Não é assim que funciona.
            Novamente eu entendi e o apoiei. O trabalho tem valor demais. Mas eu estava me cansando. Eu servia apenas para as aparências. Uma vez ele ficou uma semana sem me ver. Nem me ligou. Todas as vezes que conversamos naquela semana fui eu quem ligou. Eu não fazia falta e comecei a perceber isso. Só que percebi tarde. Passei dias tristes, pensando o que eu tinha feito de errado. Fiquei brava e aceitei o convite dos meus amigos para viajar pra praia.
- Você não vai com eles. Se você quer relaxar, eu te deixo num SPA. Você não vai.
- Eu vou sim. São meus amigos, me convidaram e eu aceitei. – Eu fui firme.
- Se você for, não precisa voltar pra mim. Porque eu não aceito que você vá com eles.
            E foi assim que eu me libertei dele. Eu falei mais algumas coisas. Disse tudo que estava engasgado. Disse como eu me sentia sozinha, mesmo estando com ele. Ele apenas disse que eu estava “doida”. Não disse mais nada. Então eu soube que aquilo tinha acabado. Só que já tinha acabado há muito tempo, mas eu não enxergava. Hoje eu sei que não havia inimigos, porque o único inimigo da nossa relação sempre foi ele.
Hoje, dois anos sem ele, estou muito melhor. Sorrio mais, não me sinto pressionada, não tenho que me preocupar em fazer as coisas para agradar a alguém e nem deixo de fazer aquilo que me faz bem. Sai com outras pessoas, mas nada sério. Até as coisas no meu trabalho melhoraram. Falando nisso, estou chegando agora na empresa de publicidade onde trabalho.
- Bom dia, meus lindos! – Cumprimento os meus amigos.
- Bom dia, Beca. Você está mais linda que o normal. Está radiante. O que aconteceu? – Léo me questiona.
- Nada em especial. Mas foi uma madrugada produtiva com os meus pensamentos. Agora consigo enxergar o passado com clareza. Estou ótima. Estou muito bem... – Não preciso falar mais nada, ele me entendeu. O Léo sempre me entendeu tão bem...
- Fico muito feliz por você. Depois temos que conversar. – Aquele sorriso maravilhoso foi pra mim. Acho que o Marcelo estava certo. Quem sabe...

quinta-feira, 18 de maio de 2017

A garota do bombom

Sou o tipo de gente que anda pelas ruas sem prestar atenção nas pessoas que estão a minha volta. Acho que não tenho muito tempo para isso, por causa da correria do dia a dia. Às vezes encontro com alguém que tenho a impressão que já vi antes, provavelmente é alguém que vejo todos os dias no metrô, mas nunca me lembro de onde a conheço. É muito raro eu entrar em uma loja e reconhecer vendedores que já me atenderam outras vezes. É a correria de sempre.
Entre tantas pessoas que passam por mim na rua eis que uma me fez percebê-la, a garota que vende bombons na estação do metrô. Desde a primeira vez que a vi ali ela não passou despercebida. Com seus lindos cabelos loiros esvoaçantes e um lindo sorriso cativante, é impossível não ser notada. Na primeira vez que ela me ofereceu bombom, comprei apenas para ajudá-la, mas naquele dia seus lindos olhos verdes não saíram da minha cabeça. No dia seguinte procurei por ela quando cheguei à estação, e para minha alegria lá estava ela, com sua cesta cheia. Dessa vez comprei cinco, e aproveitei
 para perguntar seu nome. Pensei nela o dia todo e fiquei ansioso por vê-la no outro dia. Para minha decepção ela não estava lá na manhã seguinte. Passei três dias sem vê-la, e na segunda-feira lá estava ela.
Naquela manhã Ágatha estava um pouco pálida, me aproximei e perguntei se estava se sentindo bem. Ela disse que se sentia um pouco tonta, que deveria ser porque não tomara café direito antes de sair. Convidei-a educadamente para me acompanhar em um lanche em uma padaria próxima. Pedi um misto quente bem caprichado e cappuccino para nós dois. Queria tanto conhecer melhor aquela linda garota do bombom! Aproveitei a oportunidade para perguntar discretamente um pouco sobre sua vida. Ela me contou timidamente que vendia bombons para pagar seu transporte para a faculdade. Era filha de uma doméstica que a criara sozinha, e com muito esforço passara em uma universidade federal, e agora realizava seu sonho de cursar fisioterapia. Sua mãe a ajudava, quando sobrava dinheiro, com as despesas da faculdade, mas atualmente estava doente e impossibilitada de trabalhar.
Não precisou de Ágatha falar muito para que eu me sentisse encantado por ela. Olhei para aquela linda garota guerreira, que não tinha vergonha de vender bombom para ajudar nos seus gastos com a faculdade, e fiquei pensando nas inúmeras garotas ricas que estudam no colégio particular onde sou professor de história, que tem tudo de melhor, não precisam trabalhar e estudar, e simplesmente não dão valor a tudo que têm. Então veio a minha mente “Augusto, você precisa ajudar essa garota de alguma forma”. Eu nunca tive que trabalhar e estudar. Meus pais não são ricos, mas o salário deles sempre foi suficiente para me manter enquanto eu fazia faculdade. Mesmo nunca tendo passado por isso imagino que não seja fácil.
Pago nosso café e saio correndo para não chegar atrasado ao colégio. Coincidência ou não naquele mesmo dia fica sabendo que estão precisando de uma secretária para trabalhar na escola no período da manhã, e a primeira pessoa que me vêm à cabeça é a dona dos olhos verdes mais lindos que já vi. Vou direto para a estação atrás da candidata perfeita. Pego seus contatos e a indico para a vaga. Três dias depois ela é chamada para entrevista, e felizmente a vaga é sua. Que felicidade, agora verei Ágatha todos os dias. Sempre a convido para tomar café na hora do intervalo, e pouco a pouco percebo que estou apaixonado por ela. Depois de muitos cafés tomo coragem e a convido para sair de verdade, e para minha surpresa ela aceita. No nosso primeiro beijo percebo que o meu sentimento é correspondido, e mesmo parecendo loucura, a peço em namoro no nosso primeiro encontro.
Três anos depois resolvo deixar a timidez de lado e fazer uma surpresa para minha adorada namorada. É o dia de sua formatura. Quando a cerimônia de colação de grau está quase acabando subo ao palco e começo a ler uma mensagem que escrevi para ela. Digo o quanto tenho orgulho dela, da moça guerreira que ela é, cito momentos importantes que passamos juntos e o mais importante, digo o quanto a amo. Então a chamo no palco, e quando ela está a minha frente me ajoelho a seus pés e tiro um caixinha do bolso. Abro a caixinha e mostro a ela um lindo anel, respiro fundo e falo “Ágatha, minha linda garota do bombom, quer se casar comigo?”. Ela sorri e começa a chorar, mas diz “Sim” ao meu pedido. Beijamos-nos e todos nos aplaudem.

Agora não a vejo mais com a cestinha de bombons na estação do metrô, mas sim com um jaleco branco no hospital público da nossa cidade. Agora minha noiva é fisioterapeuta, mas será eternamente minha “garota do bombom”. 

terça-feira, 16 de maio de 2017

Em meus sonhos

         Certos momentos servem para nos levar de volta ao passado e nos faz recordar cada detalhe, cada escolha. Hoje, especialmente, o passado vem me visitar e eu revivo com emoção tudo que me fez chegar até aqui. E acabo de receber um bilhete que tem um perfume que também me faz voltar ao começo de tudo. Um perfume de cravos, com toque de madeira, folhas e canela. Um perfume que não me deixa esquecer Adrian. Só que é impossível esquecê-lo. Tanto o seu perfume, como todo o resto já está marcado em mim. Ah, meu o Adrian...
            Eu era um pouco cética em relação ao amor. Achava que era uma fantasia criada e que aquilo de fato não existia. Parecia besteira demais essa história de “alma gêmea”, “amor a primeira vista”, “o amor da minha vida”. De fato não consigo concordar muito bem com isso de “alma gêmea”, de existir apenas uma pessoa pra mim em todo o mundo. Mas, hoje, acredito em almas que se conectam, que estão em sintonia e juntas são únicas. E quanto ao “amor a primeira vista” me abri a isso. Não sei se com Adrian foi amor a primeira vista, mas voltando a tudo que vivemos desde que nos conhecemos... Não sei... No final não importa. O que importa é que naquele dia nos conhecemos...
            Minha amiga Marília e eu tínhamos acabado de nos mudar para a capital. Saímos para comemorar o primeiro dia de trabalho. Não conhecíamos quase nada na cidade, muito menos aonde ir à noite para escutar música boa e conhecer pessoas interessantes. Antes de sairmos, procuramos rapidamente algum lugar não muito longe de onde morávamos. Achamos um bar com música ao vivo. Parecia que sempre ficava movimentado e tinha os mais variados estilos musicais. Concordamos e fomos até o bar. Tudo que lemos na internet estava certo. Adoramos o lugar. Era a noite de MPB e eu amei. Mais tarde o lugar ficava mais agitado e haveria DJ, tocando todos os tipos de música.
            Arrumamos uma mesa próxima ao bar e com uma ótima visão do palco, onde acontecia a apresentação da banda. Estava mesmo muito cheio. Sempre fui um pouco tímida e dificilmente conseguia começar uma conversa com estranhos. Marília não era muito diferente de mim. Aquela seria mais uma noite de apenas duas amigas sozinhas. Seria. Fui até o bar buscar algumas bebidas. Olhei para o lado e me deparei com um par de olhos verdes me encarando. Os olhos verdes mais intensos e penetrantes que eu já encontrei. Ele sorria de alguma piada que o amigo fazia, olhava ao redor para as moças. E me lançou um sorriso encantador. Devo ter corado naquele instante, mas consegui dar um sorriso tímido. Enquanto esperava as bebidas o observei. Ele era lindo demais, uma visão, mas parecia um pouco alterado pela bebida. “Não é pra mim”, pensei naquele instante. Eu nunca tive ideias sobre o cara ideal (ainda mais porque não acreditava num grande amor), mas sabia, que mesmo sendo lindo e encantador, não era o homem pra mim.
- Nossa, Lila, vi um homem maravilhoso. – Ela deu uma gargalhada. – É sério. Mas não é pra mim. E não sou pra ele.
- Por que, Cat? – Ela ficou séria.
- Olha pra mim. Não sou sexy, refinada... – Ela balançou a cabeça. – E parece ser o tipo que curte aquelas mulheres mais volumosas... E sei lá. Não alguém como eu.
- Já te falei pra largar de ser preconceituosa. Não pode criar essas ideias antes de conhecer as pessoas. E você é linda, inteligente se até sexy, quando quer. – Eu sexy? Dei uma gargalhada tão alta que as pessoas ao lado me encararam. Essa sim sou eu. Bonita sim, tímida e mestre em passar vergonha.
- Só você mesmo. Eu sexy... – Balancei a cabeça contendo outra gargalhada. – E ele estava bebendo demais, não gosto disso... – Um perfume de cravos (e canela, folhas e madeira) chegou até mim. Um perfume inesquecível acompanhado daqueles intensos olhos.
- Não gosta do quê, senhorita? – Aqueles olhos verdes me encararam e devo ter ficado super corada, de novo. – Podemos nos sentar com vocês? – Ele e o amigo continuavam nos olhando intensamente.
- Claro. – Consegui falar depois de um tempo. E eles se sentaram. Ele se sentou ao meu lado e o seu amigo ao lado da Marília. Fiquei muito nervosa. E ele continuava me encarando. – Sou a Catarina e ela a Marília. – Falei, porque aquilo estava estranho. Ele sorriu pra mim. Quantos dentes! Que sorriso maravilhoso.
- É um prazer conhecê-las. Eu sou o Adrian e aquele meu amigo feio ali é o Marcos. – O amigo dele fechou a cara, mas logo deu uma risada. – Ah, você disse que não gostava de alguma coisa.
- Ah... – Que vergonha! O que eu falo? - De passar vergonha. – Deu um sorriso tímido.
- Por causa daquela risada alta? – Assenti com a cabeça e ele sorriu. – Foi a risada mais linda que já escutei. – Que vergonha! Eu não sabia responder. Acho que ele estava flertando comigo, mas sou péssima nisso. – E ainda tímida? Acho isso encantador. Você é encantadora e tão linda. – À medida que ele falava pude sentir uma mistura daquele perfume, que eu tanto gostei, com álcool e cigarro.
- Obrigada. E sou tímida mesmo.
            Olhei para a minha amiga e ela conversava com o Marcos. Parecia mesmo encantada, assim como eu. Mas, ao mesmo tempo, eu sentia uma mistura de encanto com dúvidas. Nunca me relacionei desse jeito com alguém como Adrian. Aos poucos pude entender melhor quem ele era. Gostava de flertar, admirava muito uma mulher bonita, bebia bastante e era refinado demais. Um “filhinho de papai”, falei mais tarde com a minha amiga. Foi essa a minha primeira impressão. Marília e Marcos pareciam se entender. Eu estava me entendendo com Adrian também, mas alguma coisa me falava que ele “não era mim”. Tirando o fato de sermos de mundos completamente diferentes e de ele ter hábitos que eu não gosto, aquela conversa era boa. Ele era muito inteligente e tinha uma opinião diferente da que eu imaginava que ele teria. Eu tinha que parar com esses preconceitos. Eu estava enganada. Muito enganada. Quanto mais ele falava, mais eu me encantava. Ao final da noite, parecia que o conhecia há muito tempo. Mas ainda sim, tinha alguma coisa que me falava pra ir com calma. Escutei minha consciência e não aceitei a carona que ele e o amigo nos ofereceram. Mas acabaram nos acompanhando até o táxi.
- Foi um enorme prazer conhecê-la, Catarina. Preferia levá-la em casa, porque a noite é muito perigosa. Mas entendo o seu anseio. Você é muito linda e inteligente. Espero podermos conversar outras vezes. – E de novo aquele sorriso encantador.
- Muito obrigada. E o prazer foi meu. Eu também espero vê-lo novamente. Você é muito encantador... – E de novo, o sorriso tímido apareceu. Ele pegou minhas mãos, deu um leve beijo e me deu um intenso beijo nos lábios. Fiquei trêmula, mas correspondi. A minha cabeça girou e aquilo ocupou a minha cabeça durante toda a volta para casa. Minha amiga também estava perdida em seus pensamentos, com certeza pensando no Marcos.
            Marília e eu conversamos um pouco antes de dormir, falando sobre os homens que conhecemos. Ela se mostrou empolgada e eu confessei que também estava bastante mexida. “Vocês trocaram os números de telefone também, né?!” Confirmei e ela ficou satisfeita. Quando nos separamos fiquei mais um tempo pensando... Ele se mostrou um pouco diferente do que eu imaginava... Era um riquinho, que bebia e fumava demais, que provavelmente já teve muitas mulheres, mas era muito mais... Num primeiro momento ele era muito inteligente, compartilhava de muitos gostos que eu tinha, e parecia trabalhador. Abri um sorriso. Mas eu não podia me iludir. Adormeci. Mas aquela noite foi intensa... Sonhei com aqueles lindos olhos verdes, que me encaravam tão profundamente, de uma forma que jamais me olharam. Estávamos num jardim repleto de lindas flores. Não falamos nada. Ficamos um tempo nos encarando, conversando apenas com os olhos. Então ele me pegou as minhas mãos e as beijou. Tocou numa mexa solta do meu cabelo e deslizou os dedos até o meu rosto. Aquele toque me fez arrepiar e sentir uma enorme emoção dentro do coração. Era uma sensação nova e tão intensa. Ele tocou os meus lábios e se aproximou de mim. Nossos olhos se encontraram, assim como nossos lábios... Então acordei com o despertador tocando.
            Adrian me mandou mensagem por cinco dias seguidos. Queria me ver, mas tinha viajado a negócios. Eu não entendia aquilo muito bem, mas à medida que conversávamos mais eu sentia vontade de conversar com ele.  Falávamos sobre tudo e eu me sentia muito a vontade. No começo eu pensava que ele não iria querer me ver, depois de recusar aquela carona. Mais uma vez criei ideias erradas. Ele era muito mais do que imaginava. Tinha muitos defeitos e os que mais me incomodavam eram a bebida e o cigarro. Mas não posso mudar as pessoas. Voltando de viagem ele me telefonou e me convidou para jantar. Aceitei. Eu queria vê-lo, falar com ele e quem sabe sentir de novo aquele beijo. Eu só pensava naquele beijo e no sonho. Eu pensava nele e sorria sozinha. Muitas vezes Marília me cutucou porque eu estava perdida em alguma coisa. Eu estava perdida naquele perfume, naqueles olhos, naquele sorriso... Eu estava me apaixonando... Hoje posso falar, mas naquele momento eu me recusava a aceitar. Tudo que eu não acreditava estava preenchendo a minha vida.
            Um dia, depois de me encontrar com ele, minha amiga me pegou encostada na parede suspirando e sorrindo. Chamou-me várias vezes, até aumentar a voz. “Eu amo Adrian. Eu o amo.” Eu disse e ela sorriu. Chorei de emoção. Eu nunca tinha dito aquilo. Eu nunca amei um homem antes. “Ele é o amor da minha vida”. Novamente um sorriso da minha amiga. “Já falou isso pra ele?” Balancei a cabeça. E naquele momento eu percebi que precisava falar. De que adianta amar se eu não puder assumir isso pra ele, ainda mais depois dele falar que me amava. Sei que amor são mais atitudes do que palavras, mas eu precisava falar. Ele precisava saber de mim. Desci correndo as escadas do prédio onde morávamos. Ele não estava mais em frente ao prédio. Peguei um táxi e fui até o apartamento dele. Encontrei com ele na recepção do prédio. Sai correndo e cai no chão. Algumas pessoas me olhavam e ele se virou. Veio correndo pra me ajudar. Antes que ele pudesse me levantar, agarrei o seu rosto e lhe dei um beijo. “Eu te amo.” E finalmente eu disse. Não sei se as pessoas escutaram, mas eu não me importei. Eu o amava. “Eu te amo e não me importo de passar vergonha”, disse novamente. Ele sorriu e me levantou. “Eu também te amo.”
            Agora, três anos depois, ainda o amo. Só que o amo mais. Um amor tão intenso como antes, mas mais maduro. Crescemos juntos e conseguimos nos entender. Descobri que Adrian gostava mesmo de conhecer muitas mulheres, mas depois que me conheceu tudo mudou. “A vida ganhou um novo sentido. E se eu tenho você, não preciso de nenhuma outra.”, ele me disse uma vez. Ele melhorou em relação à bebida também. Ele bebia muito por causa da ansiedade, mas passou a ir ao médico e hoje está bem mais tranquilo. Os cigarros... ah, ainda fuma. Posso conviver com isso. Pelo menos a quantidade diminuiu. Ele vive falando que vai parar. Se ele realmente quiser, vou ajudá-lo. Aos poucos ele vai conseguir. Ele é o homem mais forte que já conheci. E lindo, sexy, charmoso, inteligente, carinhoso, fiel, leal, maravilhoso... Às vezes me pergunto se mereço isso, se mereço ele. Daqui a alguns minutos vamos nos casar... Estou me sentindo a mulher mais feliz do mundo por ter o amor da minha vida ao meu lado. Entendemos-nos, confiamos um no outro, nos amamos... Eu não acredito como eu era boba. O amor existe sim! Sinto novamente o perfume do bilhete que ele me mandou e tenho que conter as lágrimas. Não posso chorar agora. Tenho que ir me casar.

“Meu amor,
Você ainda tem tempo de fugir de mim, mas espero que não faça isso. Eu te amo e quero que você seja a minha esposa. Quero ser o seu marido e estar ao seu lado sempre. E acredite em mim, sempre vou estar com você. Desde aquela noite, em que te conheci, sabia que você seria alguém especial na minha vida. Não sabia que seria a pessoa mais importante pra mim, mas eu deveria ter entendido isso de cara, quando tive um sonho naquela noite... Não te contei isso. Mas eu sonhei com você. Sonhei com os seus olhos, com o seu sorriso, com o seu toque, com o seu cheiro... Mais tarde te conto os detalhes. Esqueça o que eu disse antes, não fuja. Te espero. E te amo pra sempre!
O sempre seu,

Adrian.”

segunda-feira, 15 de maio de 2017

Encontros e desencontros

Encontrar o amor da sua vida não é uma tarefa fácil, às vezes você o reconhece no primeiro olhar, mas aí vem a vida com seus encontros e desencontros e tudo muda. Eu encontrei o meu exatamente assim e sei bem como é.
Era uma linda manhã de terça-feira, o tempo estava frio e o sol encoberto por nuvens. Peguei meu sobretudo e sai correndo, como sempre estava super atrasada. A estação do metrô ficava a 10 minutos da minha casa, e faltavam exatos 10 minutos para a próxima partida. Eu detestava aquela correria de toda manhã, adoraria ter um carro, mas era o que a vida de uma jornalista recém formada me proporcionava.
Consegui chegar à estação quando o último passageiro embarcava. Como de costume, o vagão já estava lotado, e assim como todos os dias tive que fazer o trajeto em pé. Tudo parecia normal como sempre, até que meus olhos focaram em algo que prendeu minha atenção. Um dos passageiros que estava sentado a minha frente estava de cabeça baixa, totalmente focado no livro que estava em suas mãos. Eu não sabia o que gostaria mais de ver, se era seu rosto ou se era a capa do livro. Como leitora apaixonada, eu sempre tenho a necessidade de ver quais livros as pessoas estão lendo.
Passei cerca de 20 minutos tentando ver o rosto do rapaz, mas ele estava tão entregue ao livro que em nenhum momento levantou a cabeça. O único detalhe que estava a vista era seus cabelos, negros como a noite. Na estação seguinte o passageiro que estava ao lado do rapaz desceu, e eu aproveitei a oportunidade para sentar ao seu lado. Ao me sentar, enfim o jovem levantou a cabeça, e foi então que nossos olhares se cruzaram pela primeira vez.
Ficamos alguns segundos nos encarando, talvez uns 2 minutos, sem ninguém dizer nada. Eu estava me sentindo totalmente presa a aquele olhar. Eu precisava desviar os olhos dele, mas eu simplesmente não conseguia. Meus olhos não obedeciam aos comandos do meu cérebro. Como se lesse meus pensamentos ele desviou primeiro. E sorriu. O sorriso mais lindo que eu já recebera. Meu estômago se revirou. Nunca antes eu havia sentido isso ao conhecer alguém. Começamos a conversar, eu disse a ele que também gostava de ler, que era apaixonada por livros, e revelei que estava extremamente curiosa para ver qual ele estava lendo. Ele sorriu e levantou o livro, era uma edição de luxo de Crime e Castigo, do Fiodór Dostoiévski. Continuamos a falar de livros, e quando eu estava prestes a perguntar seu nome, infelizmente o metrô parou na estação que ele ia descer.
Quando desci do metrô estava totalmente desorientada. Eu havia conversado com o rapaz mais interessante que eu já conhecera e não sabia nada a respeito dele, nem mesmo seu nome. Como eu o encontraria novamente? O único fato que eu sabia a seu respeito era sua paixão por livros. Não sei como consegui trabalhar naquele dia. Quando cheguei em casa fui correndo para o computador. Entrei em vários grupos do Facebook sobre livros, e comecei uma busca desenfreada entre os membros na esperança de encontrar aquele lindo rosto. Infelizmente minhas pesquisas não tiveram retorno, e fiquei totalmente perdida, sem saber onde encontrá-lo. Nos dias seguintes tentei chegar à estação com 15 minutos de antecedência, para ver se o via dentro de algum vagão, mas não houve nenhum sinal dele.
Quatro meses se passaram, e embora eu nunca mais tenha tido um vestígio dele, eu nunca o esquecera, no meu íntimo sabia que precisava encontrá-lo. Numa linda manhã de verão sai atrasada de casa, e para meu completo azar quando cheguei à estação o metrô já estava saindo. Fiquei completamente arrasada quando olhei um dos vagões e vi o lindo rapaz sorridente dentro. Mais uma vez eu o vi e não pudera saber nada a seu respeito. Como estava calor ele vestia apenas a camisa do uniforme, e pude ver de relance o nome da empresa que ele trabalhava. Essa informação me pareceu útil, mas por mais que eu procurasse pessoas relacionadas à empresa em redes sociais, não encontrava nenhum sinal dele.
Minha irmã Flávia me dizia:
- Fernanda, você precisa esquecer esse rapaz, você não sabe nada a respeito dele, nem sabe se um dia o encontrará de novo.
Mas eu relutava em aceitar aquilo. Alguns meses se passaram e por fim aceitei que não veria mais aquele lindo leitor, e que, portanto, deveria tirá-lo da cabeça. Acompanhei minha irmã a uma festa de sua turma da faculdade, queria realmente me diverti e distrair a cabeça. Enquanto Flávia conversava com uns amigos resolvi dar uma volta pelo local, e para minha surpresa vi alguém que não me parecia estranho. O rapaz era alto e tinha cabelos escuros, exatamente como alguém que eu havia visto no metrô. Eu me aproximei e o garoto se virou. Quase desmaiei ao constatar que o estranho a minha frente era o meu “leitor inesquecível”. Ele me olhou e sorriu. Eu estava tão assustada que não conseguia emitir nenhuma reação.
Não parecia fazer sentido. Quando eu havia desistido da ideia de procurá-lo, ele simplesmente aparecera bem na minha frente. Eu continuava a olhar pra ele muda. Ele se aproximou e me beijou. Meu mundo pareceu parar naquele momento. Depois me deu um abraço bem apertado e disse:
- Achei que nunca mais a veria, fiquei desesperado por não saber pelo menos seu nome.
Antes que nos perdêssemos novamente perguntei seu nome. Pelo menos agora se ele desaparecesse novamente eu saberia que deveria procurar por um Matheus. Não nos desgrudamos o resto da festa. Conversamos tanto, colhi o máximo de informações a seu respeito. Ele não era da minha cidade, estava lá porque cursava Engenharia de Produção na universidade que havia lá. Era um ano mais novo que eu, e estagiava na empresa que eu havia visto no seu uniforme.

 Depois daquele dia saímos diversas vezes e nunca mais nos desencontramos. Descobrimos que os livros não eram nossa única paixão em comum. Assim como eu, ele também era cinéfilo, e um amante de vinhos. Nossos encontros são sempre cheios de expectativas, e o próximo será o mais esperado de todos, no altar, onde nos encontraremos para selarmos nosso amor para sempre. 

sábado, 13 de maio de 2017

Amor de mãe

            Eu sempre tive grandes sonhos e planos pra minha vida. Confesso que muitos dos meus planos não acabaram do jeito que eu imaginava. Mas agora consigo enxergar que acabaram do jeito que deveria ser. Ainda tenho muitos sonhos para viver, muitas coisas pra construir. Porque a cada novo dia é um passo (ou passos) em direção aquilo que eu desejo. Vencer não quer dizer que tenha sido fácil, nem difícil. Tudo depende da extensão do sonho e da força de vontade para correr atrás. E em cada caminho me deparei com desafios, mas também me deparei com pessoas que me ajudaram e algumas que tentou me fazer desistir. No final, descobri que a pessoa que poderia fazer eu realmente desistir era eu mesma. Felizmente, isso não aconteceu e hoje vivo a maior emoção da minha vida.
            Nos meus 28 anos de vida, ressalto três grandes sonhos. E em cada um deles tive a presença de minha mãe, a exigente e companheira Carmem. Outras pessoas surgiram, claro, mas a presença dela em minha vida é como uma luz, que nunca deixou meu caminho se apagar. Sou filha única e talvez por isso tenha vivido sempre sob os olhares atentos da minha mãe. Ouve momentos que eu me senti realmente sufocada. A super proteção da minha mãe era e ainda é tão intensa, que por vezes eu ficava muito chateada. Diversas ligações por dia, cobranças das mais loucas... Enfim, como uma típica adolescente eu ficava emburrada e não queria muito papo. Eu nunca entendi aquilo, parecia exagero (e talvez seja um pouco).
Pensando na minha adolescência, há o primeiro sonho. Aos 14 anos decidi o que eu gostaria de fazer na minha vida profissional. Desde muito pequena eu já gostava muito de desenhar. Mais tarde, esse gostar se transformou em paixão. Certo dia, arrumando uma caixa de papelão, que tinha um monte de bagunças minhas, encontrei cadernos velhos. Nesses cadernos encontrei diversos desenhos de casas e jardins. Sorri de alegria e emoção. A televisão ligada tirou a minha atenção dos cadernos. Estava passando uma novela. Até aí tudo bem. O dialogo entre duas jovens me fazia dar gargalhadas. Mas o que realmente chamou minha atenção foi a casa onde elas estavam. Olhei para a televisão, olhei para os meus desenhos. Dei mais uma gargalhada. Desenhos de criança, mas com traços tão intensos. Uma emoção tomou conta de mim. Eu senti ali, naquele momento, em que queria continuar desenhando, mas com mais maturidade. Eu queria fazer os meus desenhos ganharem vida e forma. Queria que aquela delicada casa azul, repleta de jardins e detalhes, fosse real. Aquele dia eu decidi que seria Arquiteta.
Repleta de emoção e segurança eu contei para a minha mãe. Com calma, ela sorriu e disse que não seria fácil. Meus pais não estudaram muitos anos, por falta de grandes oportunidades e dinheiro. “Fico feliz, Alice, que você tenha um sonho. É difícil, você sabe. Não temos muitas condições. Mas há grandes universidades federais e você é muito inteligente. Vai conseguir.” A parte do “difícil” me tocou e por um momento pensei que seria impossível conseguir. Havia tantas outras pessoas com o mesmo sonho que eu... Um minuto depois, olhei para minha mãe, que aguardava que eu falasse alguma outra coisa. Ela lavava roupa, após chegar do trabalho e parecia cansada, muito cansada. Esqueci o “difícil” e agarrei ao “vai conseguir”. Uma esperança tomou conta do meu coração. Eu estava decidida. Iria fazer Arquitetura numa universidade federal. Naquele mesmo dia eu queria ir à casa de uma amiga. Seria dia de festa do pijama. “Pode ir, mas volte cedo amanhã. Não esqueça o pijama, a escova... E não vá para outro lugar. Ah, e cuidado com o que vocês vão fazer lá. Seja uma boa menina...” E ela continuou falando e falando... Achava desnecessárias tantas recomendações. Eu era uma boa menina.
Três anos depois, passei no vestibular de Arquitetura e Urbanismo. Foi uma alegria enorme. Meu sonho estava começando a se realizar. Duas amigas também passaram e juntas fomos comemorar. “Se cuida e não chega tarde. Não beba nenhuma bebida alcoólica. Seja uma boa menina...” E isso era só o começo. A Dona Carmem era ótima pra fazer recomendações. E eu sempre achei um exagero. Era só pizza, não bebia, e continuava sendo uma boa menina. Mesmo sendo uma universidade federal eu tinha grandes gastos. A passagem do ônibus, almoço, lanches, apostilas... Enfim, não foi fácil. Mas minha mãe e meu pai continuaram me dando força e apertando o orçamento para me ajudar. Depois de certo tempo comecei a participar de um projeto e ganhei uma bolsa, o que nos ajudou muito. Mas eles continuavam ali, me ajudando em tudo. Formei. Meu sonho tinha se realizado. Todo esforço, tudo valeu a pena. “Parabéns, minha filha. Sabia que você ia conseguir. Você merece.” E mais uma vez ela estava ali (meu pai também) para me dar apoio. Logo depois da faculdade tentei alguns trabalhos. Fazer parte de um projeto na universidade me ajudou bastante. Surgiram duas oportunidades de emprego. Um na minha cidade e um numa cidade mais longe. Na minha cidade eu ganharia bem menos. Na outra cidade eu teria a oportunidade de realizar o segundo sonho.
Por meus pais eu deveria aceitar o emprego na minha cidade e ficar perto deles. Mas eu queria mudar, conhecer um novo lugar e novas pessoas. Ser independente. Depois de ouvir horas de recomendações, aceitei o emprego na outra cidade. Mudar-me fazia parte de um sonho maior, de um grande plano. O meu sonho era de conhecer o mundo, ou parte dele. Conhecer todos os países da terra é meio complicado. Mas eu queria independência e viajar para outro país. Meu plano era trabalhar, economizar bastante e viajar depois de um ano, nas minhas primeiras férias. Minha mãe me ligava quatro vezes por dia. “Queria saber se você estava bem. Tem que dar notícias... Aí é tão perigoso... Seja uma boa menina...” Aquela mesma conversa de sempre, as mesmas recomendações. Novamente um exagero. Nesse meio tempo meu pai aposentou. O dinheiro era menor do que o que ele ganhava. Minha mãe teve um problema na coluna e teve que mudar de emprego, um que era meio horário e ganhava bem menos. Preocupada com eles, eu sempre os visitava nos finais de semana. Quase um ano depois, eu consegui economizar. Tinha um bom dinheiro. Infelizmente a empresa faliu. Não entendi aquilo. Mas enfim, eu não poderia viajar. O dinheiro seria para me manter alguns meses, enquanto procurava um novo emprego. E o sonho teve que esperar. “Não se preocupe, tudo tem o momento certo.” Minha mãe dizia. Mas naquele momento as palavras não ajudavam muito. Eu estava muito chateada.
Alguns meses depois, consegui um novo emprego. Eu deveria esperar mais um ano para realizar o meu sonho. No primeiro dia de trabalho meu mundo parou. Minha cabeça girava, meus olhos brilhavam... Encontrei ali o amor da minha vida. Nicolas, o gerente financeiro da construtora. Eu estava encantava, meu coração vivia disparado. Mas pensava que ele não era pra mim. Como um cara daqueles iria se interessar por mim? Ele parecia tão inacessível. Começaram surgir na minha cabeça ideias de muito romance e até casamento. Eu já tinha tido um namorado, mas nunca pensei em casamento. Aquilo era novidade. Sosseguei um pouco. Mas continuei encantava com o cara impossível. Uma semana depois, fiquei depois do meu horário na construtora. Eu estava juntando minhas coisas para ir embora, aquilo parecia abandonado e fiquei com medo. Ouvi um barulho e dei um grito. “Desculpa. Te assustei? Pensei que não tinha mais ninguém. Eu sou o Nicolas e você é novata.” Sorri com vergonha. “Só assustei um pouco. Eu sou a Alice.” Eu estava nervosa e com muita vergonha. Aqueles olhos, aquele cabelo... Eu estava apaixonada. “Não tivemos a oportunidade de nos conhecer antes, mas já tinha te visto. Seja bem vinda. Quer uma carona?” No inicio eu tive dúvidas, comecei a pensar um tanto de besteiras. Ouvia a voz da minha mãe na minha cabeça me dizendo pra ter cuidado. Depois de uns minutos resolvi aceitar. Ele estava a bastante tempo na construtora, devia ser confiável. Poderia não ser também. Por sorte, ele foi super gentil e deu tudo certo. Começamos a sair. E a cada dia eu estava mais apaixonada. Começamos a namorar. Eu o amava e ele dizia me amar. Conheceu os meus pais. Minha mãe, ótima em interrogatórios me deixou um pouco envergonhada com a quantidade de perguntas. Nicolas pareceu não se importar. Quando conheci os pais dele descobri que a mãe dele era do mesmo jeito. Dois anos depois eu estava realizando o meu segundo e terceiro sonhos. Casamo-nos e foi perfeito. Lua de mel na Itália. Eu começava a conhecer o mundo com o amor da minha vida.
Hoje reconheço o valor daquela frase que a minha mãe me disse. “Não se preocupe, tudo tem o momento certo.” E tem mesmo. Eu fiquei meses chateada por não viajar, mas o destino me colocou em novos caminhos. Encontrei o amor da minha vida. Descobri um novo sonho. Realizei dois sonhos simultaneamente. Nisso tudo estava a força da minha mãe, que apesar de não gostar que eu fique longe, me incentivou a continuar buscando aquilo que eu queria. Eu amo minha mãe. Amo minha família. Hoje o dia amanheceu mais intenso. Nicolas e eu estamos indo para a casa dos meus pais, porque amanhã é dia das mães. Nosso plano é jantar lá e amanhã tomar um café bem especial. Voltamos antes do almoço e almoçamos com a minha sogra. Ano passado fizemos o contrário. Preferimos manter assim, pra agradar as duas famílias. Eles entendem e tudo dá certo.
Mas a emoção que me preenche vai aumentando. Não vejo a hora de conversar com a minha mãe. Sei que ela vai chorar. Hoje, mais do que nunca, entendo a Dona Carmem. Uma mulher forte, trabalhadora, super protetora, exigente e amorosa. Sempre foi difícil entender o porquê de tanto cuidado, às vezes exagerado, que me deixava um pouco irritada. Mas muitas mães são assim, cada uma do seu jeito. Elas só desejam ver seus filhos bem, saudáveis e felizes. Para nós filhos, é difícil, principalmente quando adolescentes. Aos poucos vamos entendendo... Avisto os meus pais. Já estou chorando, de novo. Nicolas aperta a minha mão e me dá um beijo. Ele está tão emocionado quando eu. Estamos inundando felicidade. Cumprimentamos meus pais e eles nos convidam para entrar.
- O que foi Alice? Por que está chorando? – Minha mãe está preocupada. Ela olha para Nicolas e ele sorri emocionado.
- Vocês vão ser avós. – Digo e nós quatro nos abraçamos.
            Junto da minha família, compartilhando a minha felicidade e ansiedade, posso me ver no futuro. Hoje, ainda no começo da gravidez, já me sinto diferente, pronta pra proteger o meu filho de tudo. Sei que a cada dia esse sentimento só vai crescer, o desejo de cuidar, de proteger, de defender de tudo e todos. Com o amor não é diferente. Já amo demais esse bebê e penso que nunca poderia amar mais, mas estou enganada. O amor só vai crescer, junto com todos os outros sentimentos de mãe. Porque esse bebê é o meu tesouro, é o meu presente, e tudo que eu fizer ainda não vai ser o suficiente. Vou errar, vou deixá-lo irritado, mas vou aprender, vou tentar melhorar. E sempre vou ter a minha mãe comigo, que vai continuar me ajudando e me dando força. Hoje o meu sonho é ver o meu bebê crescer. O meu sonho é vê-lo saudável, forte, sonhador e amado. Meu sonho é ser uma boa mãe, assim como a minha mãe é.
- E você vai ser uma ótima mãe, porque você sempre foi uma boa menina.
- Te amo, mãe.

quinta-feira, 11 de maio de 2017

Meu amor, minha enganação

A busca por um grande amor às vezes nos leva a furadas. Principalmente quando você conhece um alguém lindo e simpático e no mesmo instante já se sente apaixonada. Esse foi o meu erro. Na primeira vez que vi Carlos Eduardo me senti totalmente envolvida. Era impossível uma mulher resistir ao charme dele. Eu estava sentada sozinha em um barzinho quando ele se aproximou perguntando se podia me fazer companhia. Obviamente, encantada por aquele lindo sorriso devasso, eu não consegui dizer não, e acabei aceitando a presença dele do meu lado. Conversamos por um bom tempo, e ao final da noite trocamos alguns beijos e nossos telefones.
Tudo começou a fluir facilmente. Começamos a sair e um mês depois estávamos namorando. A essa altura eu já estava completamente apaixonada. Parece loucura, mas era a minha realidade. Na verdade era impossível não se apaixonar por Cadu. Ele era lindo, charmoso, divertido e inteligente. Seu excesso de atenção me fazia sentir a mulher mais adorada do mundo. Tudo com ele era tão perfeito. A cada quinze dias ele dava umas sumidas, mas era a trabalho. Pelo menos era o que ele me dizia. Eu ficava brava com esses sumiços, mas ele vinha com uma flor e tudo se resolvia. Como eu era tola.
No nosso aniversário de quatro meses de namoro ele me presenteou com uma viagem a Cancun. Fiquei exultante de felicidade. A viagem foi perfeita: passeios de mãos dadas, jantares a luz de velas, presentes e muitas declarações de amor. Como eu era feliz! Não havia como amar mais aquele homem. Ele era o centro do meu universo. Quando estávamos completando seis meses juntos propus a ele que começássemos a pensar no casamento. Tínhamos pouco tempo de namoro, mas estávamos tão apaixonados que não havia necessidade de esperar muito tempo. Carlos Eduardo assustou e começou a se esquivar do assunto, dizendo que era cedo demais.
Quando contei as minhas amigas a reação negativa de Cadu ao falar de casamento, Ana e Carla tentaram me alertar:
 - Luana, tem alguma coisa errada com ele. Se está tão apaixonado por que se nega a casar com a “mulher da vida dele?”.
- Não Ana! Ele não está se negando, apenas acha que é cedo.
- Lu, me desculpe, mas eu concordo com a Ana. Tem algo errado aí.
Ah não! Até Carla, minha amiga romântica, estava contra meu amor.
Eu estava cega de amor.
Passados um mês Cadu veio com uma história estranha, de que precisava viajar por um mês. Veio dizendo que era a trabalho. Dessa vez não engoli a história, mas fingi que sim para investigá-lo. Depois que ele viajou resolvi ir à empresa que ele trabalhava, e foi então que descobri a verdade.
Carlos havia tirado férias adiantadas e ido para casa, em outro estado, pois sua esposa ganharia bebê naquela semana. Fiquei chocada com o que ouvi. Liguei para ele e o confrontei. No início ele tentou negar, mas depois acabou assumindo. Ainda teve a cara de pau de dizer que me amava, que não poderia viver sem mim. Tentou me convencer de todas as formas a não deixá-lo. Disse que futuramente se separaria, que não poderia fazer isso agora, pois tinha três filhos pequenos, inclusive um recém nascido. Fiquei arrasada! Como o meu namorado perfeito fora capaz de me enganar assim?! Na verdade ele nunca existiu. Tudo não passara de uma mentira.
Nas semanas seguintes Cadu tentou me contatar, foi a minha casa, mas eu evitei todas as formas encontrá-lo. Até troquei de telefone e fiquei uns tempos na casa dos meus pais. Depois de tanto insistir e só receber recusas, o safado acabou voltando para seu estado, para sua família. Eu estava um caco. Não sei de quem eu sentia mais pena, se era de mim ou se era da esposa dele. Demorei um bom tempo para me recuperar dessa situação. Ainda não estou 100% curada, mas pelo menos tenho tentado me abrir para outros relacionamentos e voltar a viver.