domingo, 4 de novembro de 2018


Desde que te vi pela janela
           
Andei pensando, andei avaliando... Me olhei no espelho, encontrei um olhar intenso e um pouco perdido. Nos minutos seguintes eu não olhava mais aqueles olhos, eu olhava mais além. Era como se eu estivesse dentro de mim. Desde as 7hrs e 05min daquela quarta-feira quente e úmida, desde que te vi pela primeira vez da minha janela, senti algo brotar dentro de mim. Eu senti que era especial e diferente. Naquele mesmo dia eu já te tinha em perfeito delineado em minha mente. Eu nunca me esqueceria do contorno do seu rosto, do seu respirar acelerado, dos seus passos apressados. Eu nunca me esquecerei. Parece que foi ainda hoje de manhã que te vi pela primeira vez. Meus olhos cansados de uma noite mal dormida despertaram intensamente com a sua presença. Não te olhei nem por 59 segundos, mas olhei o suficiente pra perceber algo. E até sentir. Desde que te vi pela janela eu me apaixonei por você.
E no dia seguinte lá estava eu novamente na janela só esperando. Imaginei, pelo seu andar, que no dia anterior você estava atrasado, por isso acordei cedo para te ver passar. E eu estava certa. Você passou antes, com um andar concentrado, mais tranquilo. E novamente me apaixonei por você. Por dias e mais dias eu acompanhei os seus passos, às vezes apressado, às vezes distraído, tranquilo, sereno, entusiasmado. Foram dias e mais dias. E cada novo dia eu me apaixonava um pouquinho mais por você. Mas desde aquela quarta-feira eu tenho pensado, e o pensamento surgiu quando me olhei naquele espelho. Pensei em como eu gostaria de conversar com você, de olhar dentro dos seus olhos, de olhar de frente para o seu sorriso. Mas eu não tinha coragem de fazer isso, eu não poderia... “Olha pra você, Milena! Você seria suficiente? Você seria especial pra ele? Besteira, besteira! Estou apenas admirando... Muitas pessoas falariam de nós, muitas pessoas falam de outras pessoas. Ele é lindo e interessante. E eu? Não sei, não sei.”, eu avaliei perdida dentro dos meus olhos. Eu imaginava não ser capaz de ter algo com ele, nem te trocar algumas palavras. Eu não me sentia “a sua altura”. Eu pensava nas outras pessoas, que eu via sempre comentando sobre casais. Eles avaliavam uns aos outros com frequência e diziam expressões como “eles não combinam”. Então eu não ousava imaginar que nós poderíamos combinar. Mas eu continuei com os meus olhares intensos. E quando eu não o via, imagina mil coisas.
A vida de admiradora de janela se encerrava. O estranho por quem eu estava apaixonada continuava seu percurso, mas eu mudei minha rotina. Meu trabalho mudou de horário, me obrigando a sair de casa mais cedo. Fiquei chateada, mas também pensei que deveria ser um sinal pra eu esquecer aquele homem. Eu nunca seria boa o suficiente pra ele, nós nunca daríamos certo. E antes disso tudo, eu não tomaria nenhuma atitude. Mas mesmo sem vê-lo eu continuava vendo a sua imagem em minha mente. Por dias, naquele mesmo horário de antes, ele surgia em minha mente. E assim eu seguia para o trabalho. Caminhando, sorrindo e às vezes brigando comigo mesma por insistir naqueles pensamentos. Dias e dias depois algo estranho aconteceu. Estranho, bom e desafiador, para uma jovem recém saída da faculdade e ainda muito insegura no mundo. Eu seguia para o meu trabalho quando sinto algo cair na minha cabeça. Quando olho pra cima vejo a sombra de uma pessoa em um dos últimos andares de um prédio. A pessoa balança a mão e eu olho pra baixo. Vejo um papel embolado e o pego. Abro. “Pode parecer estranho, mas não paro de pensar em você. Se você for capaz de esquecer a estranheza me liga. Alan.” Não soube muito bem como reagir aquilo. Voltei novamente meus olhos para aquele homem desconhecido e acabei balançando o braço. Guardei o papel comigo e continuei o meu percurso.
Alguns minutos caminhando percebi que aquele homem não era de fato desconhecido pra mim. Era ele, mas eu custava a acreditar. Eu custava a acreditar que ele tinha me notado. Seu número de telefone estava no meu bolso. O que eu poderia fazer? Parecia que ele tinha dado o primeiro passo, queria conversar comigo ou algo assim. O que eu iria falar? Na verdade eu não precisava pensar demais. Passei dias e mais dias admirando aquele homem, eu precisava criar coragem e fazer qualquer coisa. Mas como eu era terrível quando se tratava de paquera. E ainda tinha a minha insegurança. Sempre que eu estava prestes a arriscar, alguma coisa me puxava pra trás. Eu queria ser confiante, eu queria acreditar que poderia ser uma pessoa interessante pra ele. Mas eu não conseguia. Passei o dia avaliando os prós e os contras. Arrumei mil desculpas, impedimentos. Já em casa, me debrucei na janela e olhei para o céu. Uma estrela brilhava tão forte que enchia o meu coração de emoção. Meus olhos se encheram de lágrimas. Peguei o meu celular e mandei uma mensagem meio tímida para o Alan. Sim, eu tinha o seu número e o seu nome. Então fiquei repetindo mentalmente o seu nome e sorri com a sua imagem gravada em minha mente.
 Que noite longa... Que noite maravilhosa! Instantes depois de enviar aquela mensagem ele me ligou. No início eu estava muito tímida e insegura, não falei muito. Ele disse que já havia alguns dias que queria se aproximar de mim, porque costumava me ver pela janela. Que coincidência! Não tive coragem de contar que eu fazia o mesmo. Alan falou um pouco sobre ele e aos poucos, com aquela conversa aberta e tranquila, pude me sentir mais a vontade e comecei a falar de mim também. Quando me dei conta estava falando mais do que o normal. Eu costumo falar muito somente com pessoas que já conheço há bastante tempo. Mas ali naquela noite linda, sem nem olhar em seus olhos, eu senti familiaridade, eu me senti bem. E lá estava eu me apaixonando mais um pouquinho por ele. Era mágico, era maravilhoso. Em uma noite conheci muito dele e sabia que em breve confirmaria todas aquelas sensações positivas. Ao termino da conversa voltei meu olhar novamente para o céu e reencontrei aquela brilhante estrela. Agradeci. Então adormeci com um sentimento enorme de esperança. Mas não era uma esperança no Alan, era uma esperança em mim.
O nosso primeiro encontro não poderia ter sido mais especial. Desde a primeira troca de olhares, desde o primeiro toque, eu pude confirmar tudo de bom que eu já estava sentindo. Ele parecia ser especial demais, tanto que eu às vezes duvidava daquilo ser mesmo real. Eu não estava acreditando que ele estava ali, aparentando estar mesmo interessado em mim. Todas as palavras e olhares direcionados a mim eram amorosos, de um encanto que tocava dentro de mim. Eu sentia que ele era verdadeiro, eu sentia que ele já sentia algo por mim. Era real. Mas mesmo assim minha insegurança me perseguia. Quando eu estava prestes a entrar no meu prédio me dei conta do nosso entorno. Fiquei preocupada que alguém estivesse nos olhando e imaginando coisas a nosso respeito, nos avaliando... Eu estremeci e ele percebeu. Alan queria saber o que me incomodava e eu simplesmente respondi “o mundo”. Não precisei falar mais nada. Ele segurou minhas mãos com carinho e me abraçou. Aquele abraço falava mais que qualquer texto enorme. Não existem palavras suficientes para descrever o que ele me dizia com o calor do seu corpo. E o beijo então... Eu perdi em nós e perdi tudo de mal que poderia passar em minha mente. Por um momento me esqueci do outro mundo. Eu vivia ali um mundo particular e maravilhoso, onde tudo era certo e verdadeiro. Ali nós combinávamos, ali eu era linda e interessante, ali tudo era especial.
A cada conversa, a cada novo encontro ou toque, eu me via ainda mais apaixonada. O Alan tem essa coisa indescritível, que me faz encarar o mundo com olhos eletrizantes e cheios de confiança. Ele tem uma energia contagiante. Ele exala amor. O amor vem de dentro dele, porque ele sabe como se enxergar, como se posicionar no mundo. Com o tempo, observando-o bastante, passei a me observar ainda mais. Eu seguia muito insegura, pensando que a qualquer momento ele se cansaria de mim ou que alguém iria aparecer pra falar de nós. Mas algo novo surgia. Eu já estava extasiada de paixão, meu coração fervia, minha mente era um furacão. Só seus olhos já eram capazes revirar todos os meus pensamentos. Eu estava completamente apaixonada e envolvida. Mas eu sentia mais a cada novo encontro ou nova conversa. O Alan despertava em mim momentos mais longos de pensamentos, mas não só sobre ele e sobre nós, sobre mim. E quando eu estava de frente para o espelho e começava a questionar quem eu era, eu voltava ao nosso primeiro encontro, quando ele me segurou e me levou pra um lugar mágico e único. Eu começava a me sentir mais vezes assim. A confiança surgia dentro do meu peito. Quando eu pensando no outro mundo e nos seres que o habitam, eu já não deixava mais as dúvidas tomarem conta dos meus pensamentos. Se era tão bom estar com ele, se fazíamos tão bem um para o outro e não feriamos ninguém com isso, porque eu deveria me preocupar. E se eu escutasse que não combinávamos ou algo parecido? Já não mais me importaria como antes, porque é apenas uma avaliação externa. Estar bem com ele era suficiente pra mim.
Olhei mais vezes no espelho e comecei a sorrir. Afinal, eu nem era “feia”. E eu não precisava realmente ficar me avaliando desse jeito. Eu já me sentia confiante comigo mesma, não precisava me julgar. Claro que quando eu me arrumava era diferente, sempre apareciam uns pensamentos avaliando as roupas, o cabelo. Enfim, eu já não me importava em me avaliar. Eu estava bem, independente de qualquer resposta que eu pudesse me dar. Mesmo que houvesse dias em que eu acordasse e pensasse “como estou feia hoje”; mas tudo bem, eu estava tranquila em estar feia naquele dia. Minha mudança eu devo muito ao Alan. Não necessariamente aos elogios constantes, ou aos puxões de orelha pela minha cobrança e julgamento excessivos. Mas sim aquela coragem que surgiu em mim naquela noite em que mandei a mensagem. Aquela tímida coragem foi tomando força e forma, me fez pensar mais em mim. Aquela atitude me provou que é preciso agir, que é preciso se colocar no mundo. Eu não estava confiante de quem eu era pra chegar a ter atitudes daquele tipo, ou qualquer outra que me expusesse. Mas aos poucos percebi que era preciso aceitar quem eu era e mostrar ao mundo quem eu sou.
O Alan me enxergou enquanto eu me escondia. Ele me enxerga em momentos únicos, ele me dá força, me dá amor. Então, depois de muito cuidado, de muito esforço (continuo fazendo), pude me amar e amá-lo de verdade. Eu me apaixonei por ele desde que o vi pela janela. Eu me apaixonei por ele todos os dias seguintes e continuo me apaixonando.  Mas o amor pôde sair de dentro de mim depois do dia em que eu cheguei em frente ao espelho, olhei dentro dos meus olhos e pude sentir que me amava. Eu me amava, apesar dos apesares. Há sempre muito que melhorar, há muito que aprender. E eu sigo aprendendo a me amar. Hoje posso dizer que me amo, que estou confortável com quem eu sou. E hoje posso dizer que amo o Alan. Depois de descobrir que poderia me amar, descobri que também posso amar o outro. E eu amo o Alan um pouco mais a cada novo dia. Pareço não ser capaz de sentir um amor maior, mas surge o dia seguinte e eu sinto. O amo hoje muito mais que ontem e muito menos que amanhã. E sigo apaixonada desde que o vi pela janela naquela manhã de quarta-feira.