domingo, 15 de maio de 2022

 

Criaturas misteriosas


            O que buscamos? Como buscamos? O que esperamos? O que estamos dispostos a fazer? O que estamos dispostos a arriscar? Independente das respostas, a verdade é que somos confusos e estamos perdidos neste mundo enorme e repleto de possibilidades. Quando, finalmente, sentimos, depois de muito procurar a tal da faísca, fugimos. Nós, simplesmente, fugimos daquilo que sentimos. Fugimos dos sentimentos. Fugimos do outro amado e de tudo aquilo que vem junto. Bota confusão nisso. Temos medo. Temos medo de nos expor. Temos medo de sofrer. Temos medo de não dar certo. Temos medo das incertezas. Temos medo dos grandes e lindos sentimentos. Mais do que apenas numa relação amorosa, porque também acontece nas relações de amizade. Temos medo de acabarmos dependentes do afeto e do conforto do outro. Temos medo de sermos decepcionados. Porque, infelizmente, é isso que o ser humano faz com frequência: decepciona o seu semelhante.

            Mas ainda seria viver? Podemos chamar de viver quando deixamos de sentir efetivamente o que habita o nosso coração? Sei que o medo nos impede de coisas incríveis. O medo já me impediu de coisas incríveis. O medo me deixou habitando por muito tempo a minha zona de conforto, aquele lugar que nada de extraordinário acontece. Mas eu quero viver o extraordinário. Eu quero sentir o incrível. Eu quero ter aquela sensação única de estar à beira de um abismo excitante. Se eu vou cair ou voar, eis a questão. Eu posso despencar e sentir muita dor. Mas eu também posso me jogar e ganhar asas. E ainda pode acontecer de eu encontrar um outro alguém voando ao meu lado. Eu quero viver a excitação do abismo do sentimento. No entanto, tenho medo. Muito medo. A maioria de nós tem esse medo. E se eu me jogar sozinha? E se eu sentir sozinha?

            A verdade é que somos criaturas misteriosas, repletas de desejos, sonhos, medos das expectativas e das tentativas. Somos criaturas rodeadas por sensações, impulsos e, muitas vezes, arrependimentos. Nos doar, nos expor e deixar o outro atravessar a nossa zona de conforto, é uma missão dificílima. Começa com uma grande questão: posso confiar nessa pessoa? Questão complexa, resposta difícil. Muitas vezes a confiança que depositamos em alguém pode ser quebrada após uma decepção e isso dói demais. Como saber que posso confiar? Não existe uma resposta certa e única. Afinal, cada um sente e vive de um jeito único. Eu, por exemplo, busco seguir o meu coração e a minha intuição. Ele, simplesmente, sente que a pessoa é especial, confiável e merece a minha confiança. Superado isso, outra questão: até que ponto posso me abrir? Uma terceira: até que ponto posso sentir? Uma quarta: até que ponto posso me arriscar? E, a quinta: até que ponto posso viver? São apenas algumas, das inúmeras questões que surgem quando estamos diante do outro, seja qual for a sua relação com ele.

            Criaturas misteriosas, de sentimentos e agires misteriosos. Sentimos, mas nos limitamos diariamente, nos impedindo de habitar abraços e beijos. Sentimos, mas não voamos para perto do nosso amado por medo. Temos sonhos, objetivos excitantes, mas o receio do erro nos puxa para trás e não seguimos adiante. Pobre criatura misteriosa, que muito sente, mas pouco faz e se arrisca. Pobre criatura misterioso, poderia ter um mundo inteirinho brilhando em seu coração, mas prefere não dar um passo diante do incerto. Entendo. De certo modo, entendo. Já fiz isso. Só não dá para habitar a zona de conforto para sempre. Quantos abismos extraordinários perderemos até entender isso?