Criaturas misteriosas
O que buscamos? Como buscamos? O que
esperamos? O que estamos dispostos a fazer? O que estamos dispostos a arriscar?
Independente das respostas, a verdade é que somos confusos e estamos perdidos
neste mundo enorme e repleto de possibilidades. Quando, finalmente, sentimos,
depois de muito procurar a tal da faísca, fugimos. Nós, simplesmente, fugimos daquilo
que sentimos. Fugimos dos sentimentos. Fugimos do outro amado e de tudo aquilo
que vem junto. Bota confusão nisso. Temos medo. Temos medo de nos expor. Temos
medo de sofrer. Temos medo de não dar certo. Temos medo das incertezas. Temos
medo dos grandes e lindos sentimentos. Mais do que apenas numa relação amorosa,
porque também acontece nas relações de amizade. Temos medo de acabarmos
dependentes do afeto e do conforto do outro. Temos medo de sermos
decepcionados. Porque, infelizmente, é isso que o ser humano faz com
frequência: decepciona o seu semelhante.
Mas ainda seria viver? Podemos
chamar de viver quando deixamos de sentir efetivamente o que habita o nosso
coração? Sei que o medo nos impede de coisas incríveis. O medo já me impediu de
coisas incríveis. O medo me deixou habitando por muito tempo a minha zona de
conforto, aquele lugar que nada de extraordinário acontece. Mas eu quero viver
o extraordinário. Eu quero sentir o incrível. Eu quero ter aquela sensação única
de estar à beira de um abismo excitante. Se eu vou cair ou voar, eis a questão.
Eu posso despencar e sentir muita dor. Mas eu também posso me jogar e ganhar
asas. E ainda pode acontecer de eu encontrar um outro alguém voando ao meu
lado. Eu quero viver a excitação do abismo do sentimento. No entanto, tenho
medo. Muito medo. A maioria de nós tem esse medo. E se eu me jogar sozinha? E
se eu sentir sozinha?
A verdade é que somos criaturas
misteriosas, repletas de desejos, sonhos, medos das expectativas e das
tentativas. Somos criaturas rodeadas por sensações, impulsos e, muitas vezes,
arrependimentos. Nos doar, nos expor e deixar o outro atravessar a nossa zona
de conforto, é uma missão dificílima. Começa com uma grande questão: posso
confiar nessa pessoa? Questão complexa, resposta difícil. Muitas vezes a
confiança que depositamos em alguém pode ser quebrada após uma decepção e isso
dói demais. Como saber que posso confiar? Não existe uma resposta certa e
única. Afinal, cada um sente e vive de um jeito único. Eu, por exemplo, busco
seguir o meu coração e a minha intuição. Ele, simplesmente, sente que a pessoa
é especial, confiável e merece a minha confiança. Superado isso, outra questão:
até que ponto posso me abrir? Uma terceira: até que ponto posso sentir? Uma
quarta: até que ponto posso me arriscar? E, a quinta: até que ponto posso
viver? São apenas algumas, das inúmeras questões que surgem quando estamos
diante do outro, seja qual for a sua relação com ele.
Criaturas misteriosas, de sentimentos
e agires misteriosos. Sentimos, mas nos limitamos diariamente, nos impedindo de
habitar abraços e beijos. Sentimos, mas não voamos para perto do nosso amado
por medo. Temos sonhos, objetivos excitantes, mas o receio do erro nos puxa para
trás e não seguimos adiante. Pobre criatura misteriosa, que muito sente, mas
pouco faz e se arrisca. Pobre criatura misterioso, poderia ter um mundo
inteirinho brilhando em seu coração, mas prefere não dar um passo diante do
incerto. Entendo. De certo modo, entendo. Já fiz isso. Só não dá para habitar a
zona de conforto para sempre. Quantos abismos extraordinários perderemos até
entender isso?